Paulo Guedes e economistas debatem reforma da Previdência na Câmara dos Deputados
Reforma da Previdência
Ministro da Economia diz que Previdência é fábrica de privilégios e ataca quem ganha menos. Já o economista Eduardo Fagnani afirma que reforma da Previdência acaba com o Estado social de 1988.
Nos últimos dias, a Câmara dos Deputados recebeu a equipe econômica do governo e economistas para debateram sobre a reforma da Previdência. Na quarta-feira, 8, o ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu a aprovação integral do texto da Proposta de Emenda à Constituição – PEC 6/2019, alegando que ela combate privilégios e reduz desigualdades. “A velha Previdência é uma fábrica de privilégios. A economia está afundando, há descontrole de gastos”, disse o representante do governo do presidente Jair Bolsonaro, repetindo argumentos que também foram usados pelo governo anterior, de Michel Temer para justificar a reforma trabalhista e a PEC do teto de gastos, sem que resultados concretos pudessem ser observados.
Guedes afirmou que haveria “disfunções evidentes em todas as modalidades” e citou a situação do funcionalismo público, dos militares, de estados e municípios e do RGPS, acrescentando que a reforma irá ajudar a combater privilégios e equacionar desigualdades. “A forma mais perversa do sistema atual é a forma de financiamento. [Pela PEC] quem vai ter que pagar mais e ficar mais tempo no mercado de trabalho são exatamente os mais favorecidos”, disse.
Na ocasião, o líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ), comentou um estudo feito pelo analista financeiro Márcio Carvalho, doutor em matemática aplicada pela Universidade do Colorado, Estados Unidos, segundo o qual a fórmula de cálculo que o governo está utilizando para embasar a reforma dos trabalhadores do regime privado estaria equivocada.
De acordo com a análise, as pessoas que trabalharem mais e, por consequência, contribuírem mais para a Previdência Social receberão benefícios menores do que os de quem contribuir menos, considerando as regras propostas pela PEC. “Como é que vamos confiar no governo, nas suas projeções, premissas, análises, se ele não consegue acertar nem numa fórmula matemática?”, questionou o deputado.
A esse respeito, o ministro não deu resposta detalhada e informou que iria verificar. Ele disse ainda que o governo pretende “fazer o melhor” e que o parlamento confiasse na proposta trazida pela PEC.
Uma das críticas mais frequentes dos opositores foi em relação ao impacto da reforma sobre os mais pobres. Segundo as projeções do governo, a reforma vai gerar uma economia de R$ 1,2 trilhão ao longo dos próximos dez anos. Desse total, R$ 807,9 bilhões são referentes a mudanças no regime do INSS, em que estão os menores salários. Outros R$ 224,5 bilhões virão do aperto sobre o sistema dos servidores, que recebem mais. A oposição alegou que o dado mostra que a reforma afeta os mais pobres.
Prós – Na quinta-feira, 9, foi a vez de quatro economistas apresentarem estudos sobre o tema. O economista Eduardo Fagnani, professor da Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, e o consultor Eduardo Moreira expuseram problemas da PEC 6. Em defesa da reforma, falaram o pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Paulo Tafner e o consultor legislativo do Senado, Pedro Fernando Nery.
Paulo Tafner é um grande defensor sobre a necessidade de uma reforma por conta das mudanças demográficas do país. Ele destacou que no Brasil, a conta paga pelos brasileiros com Previdência já é muito alta se comparada com países desenvolvidos. “O déficit consolidado de toda a Previdência é 5% do PIB. Somos um país jovem, mas gastamos como um país envelhecido”, disse.
Segundo o acadêmico, o problema da Previdência nos estados também é preocupante e precisa ser considerado, pois, a soma dos resultados financeiros dos entes federativos apontam para um rombo crescente que deverá chegar a R$ 144,6 bilhões neste ano. Tafner defendeu ainda fim das renúncias fiscais, como as do Simples Nacional, de entidades filantrópicas, do microempreendedor individual e da exportação da produção rural como forma de buscar o reequilíbrio das contas públicas.
O consultor legislativo do Senado Pedro Fernando Nery disse que, sem uma reforma, as despesas com a Previdência Social no âmbito do governo federal passarão de 59%, em 2019, para 79% em 2026. Isso demonstra, segundo ele, não há uma questão contábil, mas sim de escolhas. “O Sistema Único de Saúde deve receber menos recursos ou impostos devem subir para pagar a Previdência?”
Segundo o consultor do Senado, a ideia de um sistema de capitalização individual, como sugerido pelo governo, poderá agravar os atuais problemas. “O déficit previdenciário é um imposto sobre grandes pobrezas”, disse Nery, que defendeu a criação de um sistema de seguridade social destinado às crianças, uma espécie de ampliação de iniciativas como o programa Bolsa Família.
E contras – O professor do Instituto de Economia da Universidade de Campinas – Unicamp, Eduardo Fagnani, afirmou que a reforma da Previdência, instaurada pela PEC, “acaba com o Estado social de 1988” porque promove a retirada de direitos conquistados no bojo do processo de redemocratização do país.
Fagnani criticou a rigidez das normas propostas pela PEC e destacou, entre outras coisas, que a reforma teria o objetivo de acabar com a Seguridade Social, que é “o principal instrumento de proteção social do Brasil”, e que por isso irá ampliar a desigualdade no país.
O professor também criticou o sistema de capitalização trazido pela reforma e disse que as regras da PEC “são muito exigentes e desconsideram por completo a realidade do mercado de trabalho brasileiro”. Para embasar a afirmação, ele citou o panorama do desemprego nacional – que atingiu a marca de 13,4 milhões de pessoas em abril, segundo dados oficiais do IBGE – e lembrou a precarização das relações de trabalho, endossada pela reforma trabalhista. Fagnani destacou ainda o alto índice de informalidade, que faz com que muitos trabalhadores não tenham carteira assinada e, por isso, não possam contribuir para a Previdência.
O ex-banqueiro Eduardo Moreira, formado em Economia pela Universidade da Califórnia de San Diego, também fez críticas à reforma. Ele chamou a atenção para o fato de a PEC não ser igualitária naquilo que se refere à rigidez das normas. Moreira também disse que o debate público carece de maior nível de informação e detalhamento, de forma a popularizar os contrapontos ao discurso oficial do governo.
“A população está com uma ideia errada de que está se tirando dos ricos para dar para os pobres. E essa reforma não faz a situação de ninguém ficar melhor em termos de tempo para se aposentar e do quanto vai receber depois do que antes. Todos estão pagando mais ou recebendo menos. Tem que jogar com uma transparência enorme e as pessoas têm que entender o que significa a PEC 6”, disse.