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Foto: Nelson Jr./STF

Fux estreia no comando do STF: “harmonia entre os Poderes não se confunde com subserviência”

Judiciário

O ministro, que já tomou decisões controvérsias defendendo a Lava Jato e o corporativismo, deve evitar temas conflituosos. Ele quer, em um primeiro momento, manter o foco nos casos sobre o combate à pandemia e sobre meio ambiente.

Ao assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal – STF, o ministro Luiz Fux buscou reforçar a independência da Corte e afirmou que trabalhará para que o Poder Judiciário deixe de ter um “protagonismo nocivo” na política nacional. Seu antecessor no cargo, Dias Toffoli, ficou marcado por se aproximar do Executivo e fazer acenos ao Legislativo com um pacto entre os Poderes que, na prática, nunca existiu. Fux quer que a Corte Suprema e o Judiciário como um todo interfiram cada vez menos na política. Outra diferença relevante entre os dois é o posicionamento em relação à Operação Lava Jato. O novo presidente do STF é um dos principais “lavajatistas” na Corte, enquanto Toffoli é um dos ministros mais críticos, por entender que houve abusos na condução das investigações e processos.

Em seu discurso de posse, o novo presidente afirmou que a judicialização da política, fenômeno no qual um poder interfere em atribuições de outros, têm equivocadamente transformado o STF em uma espécie de oráculo. “O Supremo Tribunal Federal não detém o monopólio das respostas, nem é o legítimo oráculo, para todos os dilemas morais, políticos e econômicos de uma nação”, disse o ministro. Ele ainda cobrou que as autoridades ajudem a dar um “basta na judicialização vulgar e epidêmica de temas e conflitos em que a decisão política deva reinar”.

O ministro disse que a harmonia entre os Poderes não implica na subserviência a eles. “O mandamento da harmonia entre os Poderes não se confunde com contemplação e subserviência”. Fux também definiu cinco prioridades para a sua gestão: a proteção dos direitos humanos e do meio ambiente; a garantia da segurança jurídica para o ambiente de negócios; o combate à corrupção, ao crime organizado e à lavagem de dinheiro; o incentivo ao acesso à Justiça digital e; o fortalecimento da vocação constitucional do Supremo.

Poder reduzido na pauta – Uma das principais funções do presidente da Corte é o de definir a pauta de julgamentos do plenário. Esse poder foi reduzido durante a pandemia, quando prevaleceram os julgamentos virtuais em que os relatores dos processos podem levar seus casos diretamente. Pelo que a reportagem apurou, Fux deverá evitar temas conflituosos e quer, em um primeiro momento, manter o foco nos casos envolvendo o combate à pandemia de coronavírus e o meio ambiente.

Entre analistas críticos ao STF, há os que apostam que ele não entrará em nenhum conflito com o Executivo e suas pautas ideológicas. Um deles é o professor de direito da USP, Conrado Hubner Mendes. Em sua coluna na Folha de S. Paulo, Mendes sugeriu que Fux não compraria cinco temas caros ao bolsonarismo e que já tem ações à espera de julgamento. “O índice mais significativo de uma gestão no STF não é formado pelos casos que decide, mas pelos que prefere não decidir. Faço uma aposta sobre os cinco casos que Fux não decidirá nem que a República tussa”. Os temas são os seguintes: porte de drogas, prisões, interrupção da gravidez, juiz das garantias e decreto das armas.

Corporativismo e Lava Jato – Também pesa contra o novo presidente sua conduta tida como corporativista no passado. Foi ele quem, em 2014, concedeu auxílio moradia a todos os juízes do país por meio de uma liminar. E só suspendeu  a decisão quatro anos depois, quando o governo de Michel Temer, em um acordo com o Congresso Nacional, liberou o reajuste salarial aos magistrados. Até agora o caso ainda não teve o seu mérito julgado.

Em seu discurso, o ministro disse que a Corte não admitirá “qualquer recuo no enfrentamento da criminalidade organizada, da lavagem de dinheiro e da corrupção”. Conhecido pelos votos duros em matéria penal, citou textualmente a Lava Jato. Se não bastassem os desafios comuns para qualquer presidente de Tribunal, Fux ainda terá de se deparar com os embates que têm crescido entre a ala garantista e a ala lavajatista, da qual faz parte. De um lado, estão os ministros que têm imposto seguidas derrotas à Operação Lava Jato. Do outro, os que defendem que a investigação ainda é um baluarte do combate à corrupção. Entre os casos pendentes de julgamento, está o pedido da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que acusa ex-juiz Sergio Moro de ser parcial.

Condecorado pelo jargão lavajatista “In Fux we Trust,” dito por Sérgio Moro a Deltan Dallagnol, revelado em conversas divulgadas na Vaza Jato, retribuiu a gentileza ao ter determinado que o Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP se abstivesse de aplicar penalidade a Dallagnol. Também suspendeu, no início do ano, o juiz de garantias do Pacote Anticrime, uma das formas de controle do Judiciário, que Moro severamente criticou, em uma das primeiras crises contra o governo de Bolsonaro.

Outra decisão do ministro a favor da Operação aconteceu em 2016, quando individualmente mandou a Câmara dos Deputados reiniciar do zero a análise de uma proposta de lei elaborada pelos procuradores da força-tarefa da Lava Jato que ficou conhecida como Dez Medidas Anticorrupção. Na ocasião, a Câmara aprovou um pacote de medidas após uma série de alterações na proposta original, o que, na visão de apoiadores da operação, passou a ter efeito contrário, de dificultar o trabalho do Ministério Público e de juízes na investigação e julgamento de criminosos corruptos.

Para juristas, porém, sua chegada à presidência do STF não significará necessariamente um cenário favorável à Lava Jato na Corte, após algumas derrotas acumuladas nos últimos dois anos, como a reversão da possibilidade de prisão de condenados em segunda instância.

Eloísa Machado, professora de direito constitucional na FGV, lembra que a Lava Jato, embora ainda tenha apoio de parte da sociedade, não tem mais o mesmo prestígio depois que o site Intercept Brasil divulgou uma série de mensagens atribuídas aos procuradores da Lava Jato e ao ex-juiz Sergio Moro indicando possíveis condutas ilegais dessas autoridades na operação.

Além disso, a própria decisão de Moro de deixar a magistratura para se tornar ministro da Justiça de Bolsonaro também deixou a Lava Jato mais vulnerável aos ataques dos que veem um viés político na operação.

Até o fim do mandato de Fux, em setembro de 2022, ele se despedirá de dois ministros que se aposentarão compulsoriamente – Celso de Mello, em novembro deste ano, e Marco Aurélio, em julho de 2021. Por essa razão, ele recepcionará dois nomes que serão indicados por Jair Bolsonaro, que tem feito uma espécie de leilão pelas vagas. Nesse meio tempo, possivelmente, colocará para julgamento o processo que deve advir dos inquéritos que apuram suposto esquema de fake news liderado por bolsonaristas no STF e do que apura se o presidente interferiu politicamente na Polícia Federal.

Fonte: Com El País, BBC Brasil, Carta Capital e Brasil de Fato

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