Em decisão contra Salles, Moraes aponta ‘grave esquema de facilitação ao contrabando’
Política
O ministro do Meio Ambiente, o presidente do Ibama e outros servidores são alvos de busca e apreensão em operação da Polícia Federal nesta quarta-feira, 19, sobre exportação ilegal de madeira para a Europa e os Estados Unidos.
Ao autorizar a abertura da Operação Akuanduba na manhã desta quarta, 19, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, afirmou que as investigações da Polícia Federal apontam para um ‘grave esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais’. Na decisão, Moraes cita o suposto envolvimento do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, do presidente do Ibama, Eduardo Bim, outros servidores do órgão e empresários. A Operação apura se agentes públicos e empresários do ramo madeireiro teriam praticado crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando. A Polícia Federal cumpriu 35 mandados de busca no Distrito Federal, em São Paulo e no Pará.
A decisão de Moraes é extensa e lista a suspeita de crimes de lavagem de dinheiro, contrabando e outros possíveis delitos. No documento, o ministro reproduziu organogramas montados pela PF que apontam o caminho do suposto tráfico internacional de madeira e o uso da estrutura dos órgãos públicos para a facilitação dos supostos crimes.
Moraes determinou ainda a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Salles – dentro do período no qual se tem a suspeita dos crimes. O presidente do Ibama, outros servidores da pasta e das cinco empresas suspeitas de ligação com o esquema também tiveram os sigilos bancário e fiscal quebrados por determinação do ministro do Supremo.
O afastamento do cargo do presidente do Ibama e de outros oito servidores da área foi determinado, a pedido da Polícia Federal, como medida substitutiva da prisão cautelar para impedir eventual destruição de provas e obstrução de Justiça.
Para impedir a continuidade de eventuais delitos, o ministro ainda concedeu, a pedido da PF, a anulação de uma determinação interna do Ibama que teria dado o caminho para facilitar a venda ilegal de madeira.
PF aponta “contrabando” – A investigação começou em janeiro, após o recebimento de informações enviadas por autoridades estrangeiras sobre um “possível desvio de conduta de servidores públicos brasileiros no processo de exportação de madeira”.
A PF aponta a “existência de grave esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais” envolvendo Salles e servidores, e que um relatório financeiro elaborado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras – Coaf identificou transações suspeitas envolvendo o escritório de advocacia do ministro.
Segundo a PF, empresas responsáveis por cargas de produtos exportados ilegalmente para os Estados Unidos teriam buscado apoio do superintendente do Ibama no Pará, Walter Mendes Magalhães, e do então diretor de Uso Sustentável da Biodiversidade e Florestas do órgão, Rafael Freire de Macedo, nomeados ou promovidos por Salles, que “teriam emitido certidões e ofício, claramente sem valor, por ausência de previsão legal, que não foram aceitos pelas autoridades norte-americanas”.
Ação para liberar carga – A operação contra Salles e outros servidores foi deflagrada pouco mais de um mês depois de o ministro ter sido acusado pelo delegado Alexandre Saraiva, ex-superintendente da Polícia Federal no Amazonas, de ter agido para liberar uma carga de madeira ilegal apreendida na região.
A Operação Handroanthus confiscou em dezembro de 2020 mais de 200 mil metros cúbicos de madeira vindos do Pará. A carga, transportada em balsas pelo rio Madeira, representava a morte de aproximadamente 65 mil árvores de espécies como ipê, maçaranduba, cumaru e angelim.
Em 7 de abril, Salles se reuniu em Santarém, no Pará, com empresários alvos da apreensão e se comprometeu em apoiar uma eventual liberação das cerca de 40 mil toras após revisão da documentação, segundo noticiou a imprensa brasileira.
O ministro teria dito que ouviu dos empresários que a madeira foi derrubada de maneira legal e pedido pressa na análise pela PF. Dois dias depois, ele afirmou à Folha de S.Paulo que uma “demonização” indevida do setor madeireiro iria contribuir para aumentar o desmatamento ilegal.
Saraiva enviou em 14 de abril ao Supremo uma notícia-crime pedindo a investigação de Salles, afirmando que o ministro e o senador Telmário Mota (PROS-RR) teriam atuado para obstruir a Operação Handroanthus.
Um dia após enviar a notícia-crime ao Supremo, Saraiva foi demitido do cargo de superintendente da Polícia Federal no Amazonas, que ocupava há quatro anos. Em entrevista à DW Brasil no final de abril, ele disse que a carga de madeira que Salles tentava liberar tinha sido alvo de “fraudes grotescas” e que o ministro agiu para tentar “passar a boiada”.