STF suspende MP que transferiu demarcação de terras indígenas para Agricultura
Política
Ministro Luís Roberto Barroso diz que Bolsonaro reeditou trecho que já foi vetado pelo Congresso, o que é inconstitucional. Com decisão, demarcação volta para Funai.
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal – STF, concedeu liminar para suspender a validade do trecho da Medida Provisória – MP 886/2019 do presidente Jair Bolsonaro, que transferiu para o Ministério da Agricultura a demarcação de terras indígenas. Agora, essa tarefa voltará para a Fundação Nacional do Índio – Funai, órgão vinculado ao Ministério da Justiça. Barroso pediu para o caso ser pautado com urgência no plenário da Corte, que decidirá se mantém ou não a liminar. A MP modifica também outras estruturas do governo, que não foram suspensas pela liminar.
Em janeiro, medida provisória anterior já previa, entre outros pontos, que a demarcação de terras indígenas ficaria com a Agricultura, e que a Funai seria ligada ao Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Mas, ao analisar a medida, o Congresso devolveu essa função à Funai, e fez com que o órgão também voltasse para o Ministério da Justiça.
Mesmo assim, o presidente editou nova medida com o mesmo conteúdo e outras modificações na estrutura do governo. A decisão foi tomada em ações apresentadas à Corte pela Rede, pelo PT e pelo PDT. Para os partidos, Bolsonaro foi autoritário ao insistir na transferência e desrespeitar os parlamentares.
Na decisão, Barroso argumenta que o presidente, na MP 886/2019, reeditou conteúdo vetado pelo Congresso Nacional na análise de MP 870, que definiu a organização do Executivo. O ministro diz que, de acordo com o artigo 62 da Constituição, é vetada a reedição de medida provisória, na mesma sessão legislativa, que tenha sido rejeitada ou perdido sua eficácia por decurso de prazo.
“A se admitir tal situação, não se chegaria jamais a uma decisão definitiva e haveria clara situação de violação ao princípio da separação dos poderes. A palavra final sobre o conteúdo da lei de conversão compete ao Congresso Nacional, que atua, no caso, em sua função típica e precípua de legislador”, concluiu Barroso.
Na última quinta-feira, 20, Bolsonaro comentou a insistência da mudança nas demarcações das terras indígenas argumentando que a mudança não teria tanto efeito, uma vez que cabe ao presidente autorizar as demarcações. “Quem demarca terra indígena sou eu, não é ministro. Quem manda sou eu nessa questão, entre tantas outras. Eu que sou presidente, que assumo ônus e bônus”, justificou.
É o segundo revés sofrido por Bolsonaro no Supremo em menos de duas semanas. No primeiro, no começo do mês, nove dos 11 ministros da Corte votaram a favor da suspensão do decreto que o capitão baixara para extinguir todos os conselhos da administração pública. Ficou entendido que o presidente não tem poderes para decretar unilateralmente a extinção de conselhos criados por lei.
Procuradoria manifesta perplexidade – A Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal manifestou “perplexidade” com a decisão do governo federal de devolver a demarcação de terras indígenas ao Ministério da Agricultura.
Para o órgão do MPF, a medida é um “desrespeito ao processo legislativo, afrontando a separação de poderes e a ordem democrática” ao reeditar matéria já rejeitada pelo Congresso Nacional. Para a Procuradoria, a nova MP do governo federal “viola a Constituição, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, além de desrespeitar o processo legislativo”.