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Foto: Acervo EBC

Referência histórica de cidadania e direitos, Constituição brasileira completa 30 anos

30 anos Constituição Federal

Há 30 anos nascia a Constituição Cidadã brasileira. Foram 20 meses de discussões na Assembleia Nacional Constituinte – ANC até a aprovação em 22 de setembro de 1988 e promulgação em 5 de outubro do mesmo ano. Após 21 anos de ditadura militar (1964-1985), marcada pela intensa repressão, supressão das liberdades e perseguição política, em 1985 o Brasil, enfim, saía de um “estado de coma profundo” e voltava a respirar, embora “por meio de aparelhos”, um ar democrático. João Figueiredo, último presidente do regime militar, promoveu a abertura do governo de maneira “lenta e gradual”. O pontapé inicial foi a aprovação da Lei Orgânica dos Partidos, que possibilitou a criação de outras siglas e, consequentemente, a extinção do bipartidarismo. O primeiro quadro partidário após a Lei incluía o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o Partido Democrático Trabalhista (PDT), o Partido Democrático Social (PDS – antiga Arena) e o Partido Movimento Democrático Brasileiro (PMDB – antigo MDB).

Foto: Elza Fiuza/Arquivo/Agência Brasil

Politicamente, o grupo mais forte dentro da Assembleia Constituinte foi o Centro Democrático, popularmente conhecido como Centrão, base de apoio do governo Sarney formada por parlamentares do PMDB, PFL, PDS, PTB e algumas legendas menores. Visando dar maior resistência às pautas do Centrão, formou-se a “Articulação Progressista”, da qual participava uma ala menor de parlamentares do PMDB, além do PT, PDT, PSB, PCdoB e PCB. Havia, também, um setor intermediário que fazia alianças com os dois agrupamentos mais definidos política e ideologicamente, conforme as circunstâncias.

Na área da saúde, a participação do controle social da saúde pública no Brasil garantiu a criação do Sistema Único de Saúde foi resultado de um processo de articulação do Movimento pela Reforma Sanitária e de diversas pessoas comprometidas com o reconhecimento dos direitos sociais de cada cidadão brasileiro, ao determinar um caráter universal às ações e aos serviços de saúde no país. O processo de consolidação do SUS implicou em mudanças na legislação brasileira, buscando uma melhor implementação do Sistema. A criação do SUS tem sido considerada como a maior política de inclusão social no país inserida sob o novo regime democrático.

Foto: Arquivo Fiocruz

Desde a instituição do sistema público de saúde, quatro pontos sobre a gestão têm sido apontados como fundamentais: a descentralização, o financiamento, o controle social e a gestão do trabalho. O direito à saúde, afirmado na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, está claro na Constituição Federal de 1988, que define a saúde como direito de todos e dever do Estado, indicando os princípios e diretrizes legais do Sistema Único de Saúde.

Direitos Trabalhistas – Com o fim do regime de exceção, a sociedade, representada pelos movimentos sindical e sociais, estava ansiosa por liberdade e por direitos e isso refletiu-se no trabalho dos parlamentares. A maioria, no entanto, não tinha noção de como se fazia uma Constituição. O trabalho foi dividido em comissões e subcomissões acerca dos temas que seriam tratados.

Sob a coordenação do advogado trabalhista Ulisses Riedel de Rezende, o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – Diap teve papel decisivo no processo constituinte ao convocar as lideranças sindicais das várias entidades e dos diversos ramos para construir uma proposta com o máximo de consenso possível sobre as reivindicações dos trabalhadores a serem consagradas como direitos na nova Constituição. A Emenda Popular foi subscrita por todos os segmentos do movimento sindical.

As confederações de trabalhadores, centrais sindicais e entidades de servidores públicos coletaram mais de um milhão de assinaturas de apoio à proposta de consenso, assumida pelo então deputado Geraldo Campos (PSDB-DF), presidente da Subcomissão de Direitos dos Trabalhadores e Servidores Públicos, e subscrita por líderes e parlamentares de vários partidos. Protocolada na Presidência da Câmara dos Deputados, dia 6 de maio de 1987, a proposta foi aprovada quase na íntegra pelo colegiado. Todos os direitos do artigo 7º da Constituição faziam parte da referida Emenda Popular.

Quanto às liberdades previstas no texto constitucional, devem-se mencionar, entre outras, a liberdade de locomoção, a liberdade de pensamento e de consciência, a liberdade de expressão e de reunião. O art. 5°, XV, protege a liberdade de locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens. O dispositivo resguarda o direito de ir, vir e ficar, que se consubstancia na livre movimentação nas ruas e praças e na possibilidade de mudar de cidade, de Estado ou de região.

É livre, da mesma maneira, a entrada e saída do território nacional. A liberdade de locomoção somente poderá ser restringida em tempo de guerra, mas essa restrição não deverá resultar na sua completa eliminação. O habeas corpus é o instrumento que garante juridicamente a tutela do direito de ir e vir.

A liberdade de pensamento manifesta-se sob duas formas diferentes, mas complementares: a liberdade de consciência e a liberdade de expressão. A primeira é de foro íntimo, revelando-se no plano de consciência individual. Ela indica que ninguém poderá ser compelido a pensar desta ou daquela forma. O seu exercício pressupõe o direito de escolher entre múltiplas opções que se oferecem.

O direito à igualdade foi consagrado pela Constituição vigente em duas acepções diferentes. A igualdade tem, em primeiro lugar, o sentido de isonomia, isto é, de igualdade perante a lei. Vincula-se, sob esse aspecto, ao princípio da legalidade, que se constitui no fundamento do Estado de direito. O princípio da legalidade instaura a igualdade formal em oposição aos privilégios estamentais da Idade Média. Ele surge, por outro lado, com a finalidade de evitar o arbítrio, estabelecendo limites objetivos à ação dos governantes. Com isso, pretendeu-se submeter o poder público ao império da lei de tal sorte que as obrigações e proibições resultem exclusivamente da ordem legal. A vontade pessoal do chefe é substituída pela ordem impessoal da lei.

Participação Popular – O processo constituinte ficou marcado na trajetória constitucional brasileira pela sua inovadora abertura à ampla participação popular, motivada pelo anseio de redemocratização do país. Como consequência dessa abertura, a elaboração do texto constitucional foi precedida de um debate longo e tecnicamente difícil, mas, ao mesmo tempo, rico e democrático. De fato, a participação dos movimentos sociais ao longo da constituinte não foi constante e tampouco uniforme.

Foto: Memorial da Democracia

Os obstáculos à mobilização não foram poucos: o palco principal era o inóspito planalto central; a mobilização social após a ditadura militar teve os seus altos e baixos, sem, no entanto, provocar uma ruptura com a ordem institucional; o baixo grau de organização de grande parte dos novos movimentos que surgiam nas periferias das principais cidades em torno da luta pelas condições básicas de sobrevivência; as pautas de reivindicações de grupos temáticos que apenas começavam a atuar como movimentos nacionais ainda não estavam amadurecidas interna e externamente; com isso, a identidade e os quadros interpretativos de muitos movimentos ainda estavam em processo de formação.

Mesmo assim, entre novembro de 1986 e setembro de 1988, foi possível identificar 225 eventos relacionados ao processo constituinte. Ou seja, uma média mensal de 9,78 mobilizações sociais em torno da ANC no período.

O tipo de ação coletiva mais empregado foram as demonstrações públicas (manifestações, comícios, etc.), com 40 eventos diferentes no período (16% do total). Caravanas a Brasília e lobbies de maior ou menor grau nos corredores e no plenário do Congresso Nacional. As demonstrações públicas foram instrumentos fundamentais para que os movimentos exprimissem a sua força e unidade perante os constituintes e a opinião pública, colocando suas reivindicações em discussão na sociedade e no parlamento.

Ao completar 30 anos de vigência, a Constituição é reconhecida por ter textos generosos em direitos, mas sem aplicação plena. Segundo dados do Congresso Nacional, 119 dispositivos estão pendentes de regulamentação. Desses, 29 sequer têm proposição apresentada. A inconstância do cenário e a rotatividade entre os partidos políticos no governo da República, com ideologias diversas e distintas visões sociais, econômicas e no campo das políticas públicas tem sido um dos principais fatores para a inefetividade de muitas garantias constitucionais. Em 2018, serão escolhidos novos governantes e legisladores. Os trabalhadores devem ficar atentos àqueles que, de alguma maneira, não defendem os dispositivos ali constados e procuram tirar de nossa constituição sua característica de cidadã.

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