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Governo quer nova CPMF de 0,4% para saques e depósitos em dinheiro

Reforma Tributária

Para pagamentos no débito e no crédito, alíquota inicial estudada é de 0,2% em cada lado da operação. Retorno da CPMF, planejada por Guedes, era rechaçada por Bolsonaro durante campanha.

A equipe econômica do governo Bolsonaro comandada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, segue firme no plano de criar imposto sobre transações financeiras similar à antiga CPMF, mas com caráter permanente. Proposta de reforma tributária antecipada ontem, 10, pela Folha de São Paulo, inclui a criação de imposto com alíquota inicial de 0,4% sobre saques e depósitos em dinheiro. No caso de transações em crédito ou débito, a taxação seria de 0,2% para cada lado da operação, pagador e recebedor.

Ambas as taxas tendem a crescer após serem criadas, já que a ideia do governo é usar o novo imposto para substituir gradualmente a tributação sobre os salários, considerada pela equipe econômica como nociva para a geração de empregos no país. O retorno da CPMF, após 12 anos de extinção, contraria declarações dadas pelo presidente da República durante as eleições, que garantiu que não haveria tal iniciativa.

Como deputado federal, Jair Bolsonaro passou duas décadas atacando a CPMF. No governo Fernando Henrique, chamou a contribuição de “desgraça” e “maldita”. No governo Lula, disse que um deputado favorável à cobrança merecia o “troféu cara de pau”.

Como presidenciável, ele declarou diversas vezes que não recriaria o imposto. “Não admitiremos a volta da CPMF. É um imposto ingrato, que incide em cascata e não é justo. Não existirá a CPMF”, garantiu, às vésperas do primeiro turno.

Ao assumir o poder, Bolsonaro mudou o tom. Na semana passada, passou a dizer que topa a “nova CPMF” se houver “uma compensação para as pessoas”. Não explicou se ela viria na forma de abraço ou de tapinha nas costas.

O ministro da Economia também já começou a mudar o discurso. Para exaltar a “nova era”, ele costumava desprezar todas as iniciativas dos antecessores. Agora diz que a CPMF, criada por tucanos e mantida por petistas, “arrecadou bem e por isso durou 13 anos”.

O governo argumenta que o novo imposto vai reativar o mercado de trabalho e terá uma forma de taxação mais adequada, por atingir também setores informais e simplificar a arrecadação. Porém, não apresenta nenhum embasamento acadêmico para tal afirmativa e, como sempre, o cidadão comum, em especial o mais pobre, ficaria com a conta.

Nova CPMF substituiria tanto a tributação sobre a folha como o IOF – Durante o Fórum Nacional Tributário, organizado pelo Sindifisco Nacional, o secretário adjunto da Receita Federal, Marcelo de Sousa Silva, afirmou que o governo pretende que o imposto cobrado de pagamentos substitua gradativamente a tributação sobre a folha de pagamento, a Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido – CSLL e o Imposto sobre Operações Financeiras – IOF.

“Estamos ano a ano com regressão percentual de pessoas empregadas formalmente. E isso não pode ficar de fora da reforma tributária, porque o impacto mais significativo [para o emprego] talvez seja a desoneração sobre folha. Dentre todos os tributos no nosso ordenamento jurídico a tributação sobre folha é o mais perverso para a geração de empregos”, afirmou.

Apesar de o governo rechaçar a semelhança com a antiga CPMF, ele próprio acabou fazendo a comparação ao mostrar um gráfico com o histórico relativamente estável das alíquotas de CPMF ao longo dos anos em que vigorou, o que representaria uma previsibilidade para a nova contribuição.

Silva afirmou que, com a substituição da tributação sobre folha de pagamentos pelo novo imposto, a seguridade social acabaria sendo bancada pela população como um todo. “Estamos transferindo o ônus para toda a sociedade”, afirmou. Ele ressaltou logo em seguida que a reforma vai propor, por outro lado, benefícios como ampliação da faixa de isenções e reembolso de impostos à baixa renda.

A proposta sofrerá bastante resistência no Congresso Nacional, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM/RJ), foi taxativo ao afirmar que o Congresso não vai votar, em hipótese alguma, o retorno da CPMF, como defendem alguns setores da equipe econômica do governo.

Possíveis efeitos negativos da volta da CPMF – Economistas destacam que o imposto sobre transações financeiras incentiva as pessoas a aumentarem as transações em dinheiro vivo, provocando desbancarização. Isso corrói a própria base de cobrança do imposto, exigindo aumento da alíquota.

“É uma aventura querer usar esse tipo de imposto para substituir a contribuição das empresas para a Previdência – um dos tributos que incidem sobre a folha de pagamento. Os gastos com Previdência, mesmo com a reforma, vão continuar crescendo no país, o que vai exigir um imposto cada vez maior”, acrescenta o economista do Ipea, Rodrigo Orair.

Segundo simulação feita por Eduardo Fleury, que já foi servidor da Receita Federal, seria necessário alíquota de 0,7% para arrecadar os R$ 150 bilhões sugeridos por Guedes. “Mas, com o encolhimento da base de arrecadação, depois subiria para 1%. As propostas desse governo são muito mal estudadas”, critica.

Para o economista José Oreiro, professor da UnB, a volta da CPMF vai incentivar as pessoas a manter em casa ou andar com quantias maiores de dinheiro vivo, aumentando a insegurança.

Outro efeito, segundo ele, ocorrerá em setores da economia com cadeia de produção mais longa, já que o tributo é cumulativo. “Isso incentiva as empresas a buscar mais verticalização (concentrar todas as etapas da produção dentro do mesmo grupo) em vez de contratar fornecedores externos, o que tende a gerar ineficiência”.

Além disso, o custo dessas transações tende a ser repassado ao preço final cobrado de consumidores, afetando em maior proporção os grupos de menor renda. Esse efeito acontece porque pessoas mais pobres não têm capacidade de poupança, usando toda sua renda com consumo.

“É um imposto regressivo com maior peso sobre os mais pobres. Nenhum país desenvolvido tem”, ressalta Rodrigo Orair, do Ipea.

Levantamento realizado por Isaías Coelho, ex-chefe das divisões de Administração e Política Tributária do Fundo Monetário Internacional – FMI e ex-secretário-adjunto da Receita Federal, indica que hoje apenas a Venezuela tem imposto permanente com finalidade arrecadatória, cuja alíquota está em 2%.

Já Argentina, Bolívia, Colômbia, Honduras e Hungria estão com taxas provisórias – a mais alta é a cobrada na Argentina, de 1,2%.

Fonte: Com Folha de São Paulo, BBC Brasil, Correio Braziliense, O Globo e Revista Fórum

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