Ao celebrar suspensão de testes da Coronavac, Bolsonaro ri de tentativa de salvar vidas
Política
Depois de esbravejar contra a adoção de medidas de isolamento social por parte de governadores e prefeitos, rebelar-se contra o uso da máscara, fazer aglomerações, ficar obcecado pela cloroquina, agora, o presidente da República comemora a suspensão dos testes da vacina desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan.
O presidente Jair Bolsonaro mantém o combate à pandemia no campo da política. Depois de esbravejar contra a adoção de medidas de isolamento social por parte de governadores, rebelar-se contra o uso da máscara e aglomerar-se para finalmente contrair o coronavírus, Bolsonaro, hoje cantou vitória pelo aparente malogro do adversário. Em sua rede social, o presidente riu da decisão da Anvisa de suspender os testes da vacina Coronavac, aposta do governador de São Paulo, João Doria, para enfrentar a doença em seu Estado. Como quem pensa no futuro opositor de 2022, Bolsonaro adere ao arriscado discurso de quem parece comemorar o suposto infortúnio de uma pesquisa que tenta salvar vidas.
Sem provas, o presidente da República afirmou nesta terça-feira, 10, que a vacina chinesa Coronavac causa morte, invalidez e anomalia e que “ganhou” mais uma disputa contra o tucano. Morreram no Brasil até o momento 162 mil pessoas vítimas da Covid-19, e o que o presidente se preocupa é com isso; se “Jair Bolsonaro ganha”.
A reação do presidente Bolsonaro aumenta a suspeita de politização da Anvisa e mostra um comportamento irresponsável de tratar, mais uma vez, o combate ao coronavírus como parte da sua briga com o governador de São Paulo. Agência Nacional de Vigilância Sanitária informou ontem, 9, a suspensão dos estudos clínicos em seres humanos da vacina Coronavac. A medida teria sido tomada após o registro de um “evento adverso grave”, que não foi detalhado pela Agência.
A suspensão dos testes é uma prática comum para esclarecimentos quando um efeito adverso grave é detectado. Outros testes de vacinas contra o coronavírus, como a desenvolvida em parceria entre a Universidade de Oxford e o laboratório sueco Astrozeneca, também já passaram por breves interrupções por eventos similares e foram retomados.
A suspensão dos testes pela Anvisa ocorreu no mesmo dia em que João Doria anunciou que o primeiro lote da Coronavac chegaria a São Paulo no dia 20 de novembro. A aplicação de qualquer medicamento ou imunizante, porém, depende de aprovação da agência nacional reguladora.
A notícia da suspensão chocou profissionais próximos ao estudo. É inédito que a Anvisa tome uma medida dessa natureza sem consultar o patrocinador de uma vacina, no caso, o Butantan. Especialistas de dentro souberam pelos jornais sobre a interrupção dos estudos.
O presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas, disse que o voluntário que apresentou reação durante os testes da vacina Coronavac morreu, mas que o óbito não teria relação com a vacina. À TV Cultura, Dimas Covas disse ter estranhado a decisão da Anvisa de suspender os testes com o imunizante. “Em 1º lugar, a Anvisa foi notificada de um óbito, não de um efeito adverso. Isso é diferente. Nós até estranhamos um pouco essa decisão da Anvisa, porque é um óbito não relacionado à vacina. Ou seja, como são mais de 10 mil voluntários nesse momento, pode acontecer óbitos. Nesse momento, [o voluntário] pode ter um acidente de trânsito e morrer. E é o caso aqui. Ocorreu um óbito que não tem relação com a vacina. Portanto, não existe nenhum momento (ou motivo) para interrupção do estudo clínico”, disse.
Repercussão – O presidente Jair Bolsonaro foi criticado por políticos após comemorar a suspensão dos testes da vacina pela Avisa. Para a oposição, Bolsonaro é o maior aliado do coronavírus. O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB) questionou nas redes sociais sobre “qual vitória” Bolsonaro estava se referindo diante de quase 163 mil mortos no Brasil. “163.000 mortos no Brasil. E Bolsonaro fala que “ganhou”? Qual a vitória? O atraso de uma possível vacina? Bolsonaro continua a ser o maior aliado do coronavírus no nosso país”, escreveu o governador do Maranhão.
“Saúde é coisa séria. Não há espaço para esse jogo político. É pela ineficácia do governo federal que defendemos a negociação direta do município com países que fabricarão a vacina”, alegou a candidata à Prefeitura de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, Manuela D’Ávila (PCdoB).
O PSDB emitiu nota dizendo que “a atitude do presidente é mais uma prova de que coloca suas pretensões políticas acima de todos e realmente não se importa com a vida dos brasileiros”.
Para o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL/RJ), o presidente estimula a briga ideológica às custas das vidas dos brasileiros. “Jair Bolsonaro estimula a briga ideológica às custas das vidas dos brasileiros. Já são mais de 162 mil mortes por Covid no país. Quem comemora a suspensão de estudos de uma vacina no meio de uma pandemia? Em que lugar do mundo isso é ganhar?”.