Unicef diz que pandemia afeta mais famílias com criança e adolescente
Brasil
Levantamento feito pelo Ibope e Unicef aponta que, nove milhões de brasileiros deixaram de comer por falta de dinheiro durante a pandemia. Além da mesa vazia, lares com crianças e adolescentes sofreram com alimentação de pior qualidade, que contribui para obesidade.
Os efeitos socioeconômicos da crise sanitária causada pela Covid-19 no Brasil impactaram mais as famílias com crianças ou adolescentes. Dados de uma pesquisa realizada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância – Unicef indicam que, desde a confirmação da chegada do novo coronavírus ao Brasil, no fim de fevereiro, essas famílias vêm sendo mais afetadas pela redução de rendimentos e a outros aspectos negativos da pandemia.
A pesquisa Impactos Primários e Secundários da Covid-19 em Crianças e Adolescentes foi feita pelo Ibope, entre os dias 3 e 18 de julho, por telefone, ouviu 1.516 entrevistas com pessoas de todo o país, com idade superior a 18 anos. Dos entrevistados, 60% não residiam com crianças ou adolescentes, e 40% moravam com alguém com menos de 17 anos.
De acordo com o levantamento, 21% dos entrevistados afirmaram que vivenciaram momentos em que os alimentos acabaram e não havia dinheiro para comprar mais. Entre os que vivem com crianças e adolescentes em casa, esse percentual foi de 27%. Sem ter a quem recorrer, como programas de distribuição de alimentos, 6% disseram que a única saída foi deixar de comer, o que representa cerca de nove milhões de brasileiros deixando de realizar alguma refeição por falta de dinheiro. Nos lares com crianças e adolescentes, esse percentual sobe para 8%.
O estudo ainda mostra que a comida, quando tem, é de pior qualidade em muitos casos. Quase metade – 49 dos brasileiros sofreu alguma mudança nos hábitos alimentares neste período de quarentena. Entre as famílias que vivem com crianças ou adolescentes o impacto foi ainda maior: 58%. Isso inclui o aumento do consumo de alimentos industrializados, refrigerantes e fast food, o que contribuiu para a evolução de outra epidemia, explica Cristina Albuquerque, chefe de saúde do Unicef Brasil. “A Covid-19 pode trazer um agravamento da epidemia da obesidade entre crianças, adolescentes e nas famílias”, afirmou.
A mesa vazia é reflexo direto da crise econômica que abalou principalmente as famílias mais pobres durante a pandemia. Mais da metade dos entrevistados – 55% disse que o rendimento caiu desde o início da pandemia. Em muitos casos, a redução se deu por causa das demissões, já que 64% afirmaram que estavam trabalhando antes da chegada do coronavírus ao Brasil, mas, no momento da pesquisa, realizada em julho, este percentual havia caído para 50%. Já os lares com crianças e adolescentes foram especialmente afetados também neste campo: nessas casas, 63% afirmaram que o rendimento caiu. Em 25% desses lares, a renda diminui pela metade. Já nas casas sem crianças, a mesma redução foi observada por 14%.
Direito à educação – Na educação, a pandemia mudou a rotina de crianças, adolescentes e famílias. Com o fechamento das escolas, o Unicef estima que 44 milhões de meninas e meninos ficaram longe das salas de aula no país.
O cenário, no entanto, não quer dizer que todos ficaram sem aulas. Segundo a pesquisa, 91% dos brasileiros que moram com crianças ou adolescentes de 4 a 17 anos que estavam matriculados na escola antes da pandemia afirmaram que eles continuaram realizando, em casa, as atividades escolares durante a pandemia – sendo 89% dos matriculados em escolas públicas e 94% nas particulares.
Há, no entanto, 9% de crianças e adolescentes que estavam na escola antes da pandemia e não conseguiram continuar as atividades em casa – ficando excluídos da escola.
Entre quem conseguiu, a maioria dos estudantes (87%) passou a realizar as atividades pela internet – 97% entre estudantes em escolas particulares e 81% nas escolas públicas. No entanto, o nível de frequência mostra divergências significativas. Nos cinco dias da semana anteriores à pesquisa, 63% dos estudantes receberam tarefas e atividades escolares, enquanto 12% não receberam tarefa nenhuma e 6% somente em apenas um dia – ficando assim à margem do processo de aprendizagem.
Tanto nas escolas públicas quanto nas escolas privadas, a comunicação com as famílias se manteve ativa. Segundo a pesquisa, 68% afirmam ter recebido contatos da escola para informar progressos das crianças nas atividades – 71% nas particulares e 65% nas públicas. Além disso, 48% afirmam que a escola entrou em contato para saber como estava a situação da casa e das crianças e dos adolescentes. Nesse ponto, o contato foi maior para quem tem filhos em escolas públicas, 51%, versus particulares, 44%.
“A pesquisa reflete o esforço das escolas e redes de ensino em manter o direito de aprender. Mesmo com a pandemia, a maioria das escolas manteve o contato com as famílias, o que é fundamental para entender a situação dos estudantes e aprimorar as atividades oferecidas de forma remota”, afirma Ítalo Dutra, chefe de Educação do Unicef no Brasil.
“Por outro lado, a pandemia aumentou as desigualdades. Isso se reflete nos percentuais de meninas e meninos que não conseguiram manter a aprendizagem em casa. Diante da crise provocada pela Covid-19, há que se ter um esforço ainda maior para que a exclusão escolar não aumente no país”.