Ministério da Saúde amplia recomendação de uso da cloroquina para crianças e grávidas
Saúde
Nova orientação é anunciada no dia em que os Estados Unidos revogaram autorização para uso emergencial da droga no contexto da pandemia.
O Ministério da Saúde anunciou na segunda-feira, 15, que passou a recomendar o uso da cloroquina e hidroxicloroquina para crianças e grávidas com sintomas de Covid-19. Não há comprovação científica do uso do medicamento para combater o coronavírus, e a droga aumenta o risco cardíaco, o que pode ocasionar a morte de quem usa.
Em apresentação enviada à imprensa, a pasta recomenda dosagens específicas de cloroquina ou de hidroxicloroquina para crianças e gestantes tanto com sintomas leves quanto moderados ou graves. Os sintomas leves são: perda de olfato ou paladar, coriza, diarreia, dor abdominal, febre, dor muscular, tosse, fadiga e dor de cabeça
No caso de crianças com sintomas leves, a orientação é “prescrever se estiverem presentes fatores de risco como: diabetes, hipertensão arterial, obesidade, asma grave, disfunções orgânicas crônicas, cardiopatias congênitas ou adquiridas, pneumopatia crônica, doença neurológica crônica e imunodeficiência”.
Integrantes do governo afirmaram que a nota informativa anterior sobre medicamentos para tratar o novo coronavírus no SUS – Sistema Único de Saúde será substituída por uma nova. A nota informativa anterior, assinada em 20 de junho, afirma apenas que deveria ser dada “prioridade ao uso de hidroxicloroquina pelo risco de toxicidade da cloroquina” no caso das crianças. O texto não mencionava gestantes.
Grávidas podem estar mais suscetíveis ao novo coronavírus se tiverem comorbidades, como diabetes ou cardiopatias. A Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia afirma que não existem estudos demonstrando efetividade ou segurança no uso da cloroquina para o grupo e que o tratamento deve “considerar a gravidade do quadro clínico materno e a terapêutica deve ficar a critério do médico assistente, em decisão compartilhada com a gestante”.
Parecer científico da Sociedade Brasileira de Pediatria – SBP, por sua vez, desaconselha o uso de cloroquina em crianças e adolescentes com diagnóstico de Covid-19.
Questionada sobre a segurança do uso do medicamento, a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação do ministério, Mayra Pinheiro, afirmou que a atualização do documento de manejo das medicações possibilita “aos médicos oferta de dose segura sem risco” para ambos os grupos.
De acordo com Pinheiro, em reunião com integrantes do Ministério Público, foi esclarecido que o governo está apenas permitindo que médicos prescrevam o medicamento – e não obrigando o uso. A atuação da pasta tem sido apontada como ilegal por especialistas, além de gerar uma pressão sobre a classe médica.
Sem apresentar dados, a secretária afirmou que houve diminuição de casos de Covid desde a ampliação da recomendação do uso da droga em maio. O que se observa nos boletins epidemiológicos é o contrário. O Brasil é o epicentro da pandemia no mundo. Enquanto todos os países mostraram desaceleração a partir do 50º dia após o início da contaminação, nós seguimos na direção contrária. A partir do 54º dia, o Brasil é o país com a maior taxa de crescimento de casos confirmados, de acordo com dados analisados pelo grupo Covid-19 Brasil.
Estados Unidos revogam uso da cloroquina – O anúncio do governo federal ocorre no mesmo dia em que a agência de controle de drogas dos Estados Unidos, o Food and Drug Administration – FDA, revogou a autorização de uso emergencial de cloroquina e da hidroxicloroquina como tratamento para pacientes com Covid-19.
O órgão afirmou que ”à luz dos eventos adversos cardíacos graves e outros efeitos colaterais graves, os benefícios conhecidos e potenciais” de ambas as drogas “não superam mais os riscos conhecidos e potenciais para o uso autorizado”.
Questionada sobre o tema, Mayra Pinheiro afirmou que a decisão americana não muda o cenário brasileiro. “Os trabalhos citados como referência na descrição do FDA mostram referências que não podem ser utilizadas como exemplo nem para o Brasil nem para o mundo. São trabalhos de péssima qualidade metodológica e, portanto, vamos continuar produzindo bons trabalhos no Brasil pelos pesquisadores que estão em atuação e vamos continuar aguardando que o mundo produza evidências que levarão algum tempo”, disse.
A secretária disse ainda que as doses do medicamento doadas pelos Estados Unidos “foram muito bem-vindas” e “se Deus quiser são muito bem aplicadas para salvar a vida de brasileiros que queiram se utilizar dessa medicações”.
É consenso na comunidade científica que ainda não existe nenhum tratamento comprovadamente eficaz para a Covid-19. Estudo publicado em 11 maio no Journal of the American Medical Association – Jama, com dados de 1.438 pacientes infectados com o coronavírus internados entre 15 de março e 24 de abril em hospitais da região metropolitana de Nova York, revelou que não houve diferença significativa entre a taxa de letalidade dos que usaram hidroxicloroquina e dos que não usaram.
Outra pesquisa, publicada no New England Journal of Medicine – NEJM, em 7 de maio, com 1.376 pacientes americanos de Covid-19, mostrou que pacientes com e sem o tratamento com hidroxicloroquina apresentavam o mesmo risco de uma piora do quadro e de morte.
Na contramão do entendimento da comunidade científica internacional, integrantes do Ministério da Saúde, mais uma vez, criticaram a qualidade de estudos usados como referência por especialistas em diversos países. Foram distribuídos 2,9 milhões de comprimidos de cloroquina no SUS para pacientes de Covid-19, de acordo com a pasta.