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Foto: Isac Nóbrega/PR

Recuos, brigas, inoperância e vexames internacionais marcam o primeiro ano da gestão Bolsonaro

Política

Presidente e seu entorno acumulam desentendimentos com parlamentares e com o próprio partido, já voltaram atrás não apenas em falas e discursos, mas em medidas concretas, como exonerações e políticas públicas. Além disso, o governo do capitão é marcado por brigas ideológicas e descrédito nas declarações.

O presidente Jair Bolsonaro completa o primeiro ano de gestão carregando nas costas projetos impopulares, promessas de crescimento não alcançadas, declarações polêmicas, recuos, desentendimentos constantes com parlamentares, interferência da família e vexames internacionais.

Na tentativa de manter a popularidade junto ao seu nicho eleitoral mais fiel, que lhe rende cerca de 30% de aprovação, com apoio praticamente cego de, no máximo, uns 20%, o presidente continua em campanha e abriu mão de governar, tornando meras promessas as prioridades de recuperação econômica.

Desde a redemocratização, só Fernando Collor teve popularidade inferior a Bolsonaro no primeiro ano de governo. Ficou com 23% após seu desastroso plano econômico que confiscou a poupança. Dilma, Lula e Fernando Henrique Cardoso terminaram os mesmos períodos com aprovações de 59%, 42% e 41%, respectivamente. Para Lula e Fernando Henrique, os cenários econômicos internos e externos foram bem mais desafiadores, exigindo articulações políticas complexas.

O que deveria alarmar o núcleo do governo são os 36% de reprovação que o presidente angariou nesses 12 meses de mandato. Outro dado preocupante é que 80% dos pesquisados dizem desconfiar das suas declarações, com 43% duvidando “sempre” daquilo que ele diz. Há razões para tanto, já que Bolsonaro culpou ONGs e o ator norte-americano Leonardo DiCaprio por queimadas na Amazônia e o Greenpeace pelo vazamento de óleo no Nordeste.

A CNTS elencou 7 políticas e posicionamentos adotados por Bolsonaro durante um ano de seu governo que, apesar dos discursos generalistas e elogiosos da gestão, escancaram um Brasil em crise e a retirada de direitos da população.

Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

Reforma da Previdência – Não há dúvida de que a reforma da Previdência está entre os acontecimentos de maior destaque da conjuntura brasileira no último período. Principal proposta defendida por Paulo Guedes, ministro da Economia, as alterações no sistema previdenciário foram aprovadas no dia 22 de outubro após conturbado processo no Congresso Nacional.

Duramente criticada por economistas da área, movimento sociais e sindicais, a nova aposentadoria estabeleceu uma idade mínima de 65 anos para os homens e 62 anos para as mulheres com tempo mínimo de contribuição de 20 anos e 15 anos, respectivamente.

O valor será equivalente a 60% da média do valor de referência das contribuições. Para ter direito ao valor integral, a partir de agora, trabalhadores devem contribuir por 40 anos. Na prática, o trabalhador e a trabalhadora terão que trabalhar muito mais tempo, além do limite da idade mínima, para ter direito ao valor integral.

A reforma também acabou com a regra da aposentadoria por idade, que exigia 15 anos de contribuição e idade mínima de 60 anos para a mulher e 65 anos para os homens. De cada dez aposentadorias concedidas, sete eram por idade.

Reforma previdenciária dos militares – Enquanto faz a população trabalhar mais e ganhar menos, o governo Bolsonaro garantiu várias benesses aos militares, que representam hoje metade dos gastos da Previdência entre o funcionalismo público. Aprovado no começo de dezembro, a proposta do governo, elaborada por membros do Ministério da Defesa, prevê que os militares não terão obrigatoriedade de cumprir idade mínima de 65 anos – homens e 62 anos – mulheres para requerer a aposentadoria. Hoje, a idade para aposentadoria dos militares varia de 44 a 66 anos, dependendo do posto ou graduação.

O Projeto de Lei de Reestruturação das Forças Armadas eleva essa idade para 50 a 70 anos, o que permitirá que os militares de todas as patentes passem mais tempo na ativa, se quiserem. Quando se aposentarem, os militares receberão o mesmo valor do último salário, integralidade, e os reajustes serão iguais aos dados aos ativos, paridade.

A contribuição dos militares será de 10,5%. Trabalhadores e trabalhadoras da iniciativa privada contribuem mensalmente com percentuais que vão de 7,5% a 11,68% ao INSS.

Em compensação, os militares terão direito a adicionais pela dedicação exclusiva à carreira, que podem variar de 5% no início da carreira, a 32%, no final. Para os oficiais-generais, o percentual vai de 35% a 45%. Além disso, os militares terão reajuste no adicional de habitação anual, até 2023, que será incorporado aos soldos, e nas ajudas de custo, gratificações de representação e auxílio-transporte.

Foto: Mídia Ninja

Política ambiental – As queimadas que se alastraram pela Amazônia entre agosto e setembro, estimuladas por pecuaristas e fazendeiros da região, aprofundaram a crise ambiental do país. A destruição da maior floresta tropical do mundo colocou em xeque a política ambiental de Bolsonaro e de Ricardo Salles, ministro do meio ambiente.

Ambos, diversas vezes, desqualificaram e ignoraram dados produzidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – Inpe em relação ao desmatamento na região. Com a repercussão internacional do fogo, Bolsonaro minimizou os impactos da destruição – inclusive durante a assembleia geral das Nações Unidas – e atacou o auxílio oferecido por outros países.

A postura do governo em relação ao combate à contaminação do oceano após vazamento de óleo cru no litoral nordestino desde o final de agosto também é amplamente criticada.

Além das incertezas em relação à não identificação do navio responsável pelo derramamento, a gestão de Bolsonaro não adotou o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo – PNC, segundo o Ministério Público Federal – MPF.

Criado por decreto presidencial em 2013, o Plano apresenta em detalhes os procedimentos a serem adotados em casos de acidentes como o que atinge as praias brasileiras.

Precarização recorde – Segundo dados revelados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, em novembro, a informalidade cresce em ritmo acelerado no país. A oferta de postos de trabalho informais disparou e bateu o recorde da série histórica, chegando a 41,4% da força de trabalho brasileira, o equivalente a 38 milhões de pessoas. Ou seja: 38 milhões de brasileiros não possuem seus direitos trabalhistas assegurados pela Consolidação da Lei do Trabalho – CLT.

Ainda de acordo com o IBGE, o contingente de desempregados soma 12,5 milhões de pessoas. Ainda de acordo com os dados da Pnad, 4,7 milhões de brasileiros desistiram de procurar emprego.

E o que faz o governo Bolsonaro para tentar mudar esta realidade? Apresenta a Medida Provisória – MP 905/2019, que cria o Programa Emprego Verde Amarelo, altera cerca de 60 artigos e 150 dispositivos da CLT e revoga outros 37 dispositivos atualmente vigentes do principal diploma trabalhista do país, nos quais muda regras para trabalho aos domingos, jornadas de trabalho, multas, registros profissionais, fiscalização, FGTS e outros dispositivos que reduzem direitos dos trabalhadores. O pretexto do governo com a medida é de estimular empregos para jovens na faixa de 18 a 29 anos. O objetivo principal do programa, no entanto, é reduzir os custos de empregadores para contratação de vagas que paguem até 1,5 salário mínimo por dois anos. A contribuição previdenciária patronal passa a ser zero – antes, era de 20%. Além disso, o empregador deixa de pagar as contribuições de salário-educação e do Sistema S.

Quem for contratado com carteira verde amarela receberá menor contribuição patronal ao FGTS. O valor de 8% do salário passa a ser de apenas 2%. Como consequência, a multa que esse trabalhador irá receber em caso de demissão também será menor: em vez de 40% do fundo de garantia, ele terá direito a apenas 20% do valor. Para compensar a perda de arrecadação, o governo vai cobrar 7,5% de contribuição previdenciária de quem recebe seguro-desemprego.

Foto: Jornalistas Livres

Cortes na educação e na pesquisa – Nos 12 primeiros meses de governo de Jair Bolsonaro, poucos ministérios despertaram tanta polêmica e debate quanto o da Educação. Citada pelo presidente como área que seria prioritária em sua gestão, a educação manteve-se sob os holofotes do país inteiro nos primeiros meses do governo: foi alvo de corte bilionário de gastos públicos, o que motivou alguns dos maiores protestos populares de rua registrados neste primeiro semestre.

Desde a primeira semana de governo, a área da educação foi um dos principais alvos de Bolsonaro e de sua equipe ministerial. Além da perseguição a suposta “ideologia de gênero”, o anúncio do corte de 30% no orçamento das universidades e institutos federais foram estopim de atos massivos e da primeira greve geral contra o governo.

Abraham Weintraub é o segundo ministro a comandar o MEC desde o início do governo. Antes dele, o titular da pasta era Ricardo Vélez Rodríguez, demitido em 8 de abril em meio a disputas entre diferentes alas dentro do ministério – críticos diziam que o MEC estava dividido entre ideológicos ligados a Olavo de Carvalho, militares e técnicos – e depois de diversas medidas polêmicas do ministro.

As principais delas: Vélez havia pedido que escolas filmassem os alunos cantando o hino nacional, mas voltou atrás quando veio à tona que ele não tinha autorização parental para isso; ele também defendeu, em entrevista ao jornal Valor Econômico, revisar os livros didáticos para mudar a forma como eles retratam o golpe de 1964 e a ditadura militar.

Weintraub não ficou atrás na polêmica. Por conta de uma suposta “balbúrdia” nas universidades federais, R$ 5,8 bilhões foram contingenciados da pasta da educação, afetando não apenas as universidades, mas institutos federais de educação, à concessão de bolsas e até a programas ligados à educação básica, área considerada prioritária pelo próprio governo.

Soberania em risco – A chegada de Paulo Guedes ao governo radicalizou a orientação econômica privatista da equipe de Michel Temer. Eletrobras, Petrobras, sistema educacional: todo patrimônio brasileiro parece caminhar para desnacionalização, privatização ou extinção.

Bolsonaro consolidou o realinhamento do Brasil com os interesses da política externa dos Estados Unidos. O mandatário busca proximidade com os Estados Unidos e com a imagem do presidente Donald Trump.

Logo nos primeiros meses de governo, o mandatário assinou acordo para deixar de exigir visto de entrada para cidadãos estadunidenses no Brasil, sem contrapartida.

A entrega da Base de Alcântara, porém, é um dos maiores símbolos de submissão apontado por especialistas. O chamado Acordo de Salvaguardas Tecnológicas, assinado em março deste ano, estabelece regras que protegem a tecnologia estadunidense para lançamentos. O texto estabelece ainda normas para técnicos brasileiros em relação ao uso da base, restringindo a circulação nela.

A prontidão em atender os interesses do presidente estadunidense, no entanto, não impediu que Trump se recusasse a endossar a tentativa do Brasil de ingressar na Organização de Cooperação e Desenvolvimento – OCDE.

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Aumento de violações dos direitos humanos – Isso é mais evidente tendo em vista a explosão da violência policial. A extensão da violência estatal contra populações negras, pobres e faveladas é inacreditável. Estimulada pelo governo federal, governos estatuais e pelo projeto anticrime de Sérgio Moro, que permitia aos militares matarem, alegando “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”, 1.800 pessoas foram assassinadas pela polícia neste ano. Crianças, negros, jovens, indígenas estão sendo mortos no país por uma suposta guerra às drogas e por exploração de terras indígenas.

Além disso, os primeiros 12 meses da gestão Bolsonaro também estão sendo marcada pelo culto à ditadura e os ataques à imprensa. Levantamento feito pela Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj aponta que o presidente ataca jornalistas por meio de discursos, postagens em redes sociais e entrevistas, ao menos duas vezes por semana.

Indo além, o governo também desmontou o órgão responsável por investigar violações de direitos humanos em locais como penitenciárias, hospitais psiquiátricos, abrigos de idosos; desmontou a Comissão de Anistia e a Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos; regulamentou portaria que retirou direitos dos imigrantes; e editou decretos para facilitar o acesso às armas de fogo.

CNTS

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