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Procurador da PRT/AL fala sobre os prejuízos da reforma trabalhista

A reforma trabalhista – Lei 13.647/17 já começou a causar prejuízos aos trabalhadores. Em Alagoas, hospitais particulares e filantrópicos começaram a aplicar a jornada de doze horas diurnas para auxiliares e técnicos de enfermagem sem negociação junto aos sindicatos.

A Santa Casa de Misericórdia de Maceió foi a primeira das unidades de saúde a modificar a carga horária sem acordo com a categoria de trabalhadores, numa tentativa de prejudicar os profissionais, precarizando os atendimentos aos pacientes. O caso foi denunciado pelo Sateal à Procuradoria Regional do Trabalho, que recomendou que a Santa Casa revogue a decisão, sob pena de responder a ação civil pública. 

Os procuradores do Ministério Público do Trabalho têm empenhado esforços para combater práticas aprovadas na reforma trabalhista que ferem aspectos da Constituição Federal, mas a guerra é desigual e sempre deixa muitos danos. Em entrevista ao Sateal, o procurador Cássio Araújo aponta alguns dos prejuízos aos quais os trabalhadores estão submetidos e chama atenção dos profissionais para a importância de fortalecer os sindicatos, pois as entidades podem fazer a diferença no combate as práticas nocivas dos empregadores. 

Sateal – Quais os aspectos da reforma trabalhista que mais prejudicaram os trabalhadores?

Cássio Araújo – De uma maneira geral, a reforma trabalhista alterou para pior as condições de trabalho que haviam anteriormente, prejudicando seriamente os direitos dos trabalhadores. A extensão da jornada sem limites; a retirada da natureza salarial de parcelas consideráveis, o que significa que o trabalhador recebe uma parte do seu salário em que não será contado para fins de fundo de garantia, décimo terceiro, férias, ficando ao alvedrio do empregador dizer quanto será destinado para contribuição. Só esses dois pontos atingem pilares do contrato de trabalho.

No mundo do trabalho sempre houve a negociação coletiva, que era feita para buscar melhorias na vida do trabalhador. Quando se fala do negociado prevalecer sobre o legislado, isso significa uma piora na vida do trabalhador. Se a pergunta fosse “em qual aspecto a Reforma favorece o trabalhador”, iriamos procurar e não encontraríamos nada favorável. 

S – Acordos individuais e rescisões contratuais sem a participação do Sindicato geram prejuízos ao trabalhador?

CA – Com certeza. A relação entre empregado e empresa é assimétrica. A empresa como fornecedora do emprego no modo ao qual o trabalhador garante a sua sobrevivência e o trabalhador que depende desse emprego é a mesma coisa que comparar a relação entre o gigante, que tudo pode, e o anão, que precisa obedecer. Acordos entre patrão e empregado feitos diretamente entre as partes tendem a ser muito benéficos para as empresas e muito prejudiciais para o trabalhador.

Numa série de situações em que teria que haver a participação obrigatória dos sindicatos, fazendo um contraponto a esse poderio maior da empresa deixa de existir a partir da Reforma. A reforma deixa de exigir a participação dos sindicatos em várias regulamentações das relações de trabalho, por exemplo, na compensação de horas extras, que antes eram mediadas pelo sindicato e que a Reforma entende que não é mais preciso. A questão das rescisões contratuais sem homologação vai abrir uma brecha para um problema muito sério.

Antes da reforma, o percentual das reclamações trabalhistas envolvia o pagamento das verbas rescisórias, isso com fiscalização dos sindicatos, do Ministério do Trabalho, do Ministério Público. Com a da retirada da obrigatoriedade das homologações, que segundo os autores da reforma era uma questão burocrática, isso tende a aumentar. Inclusive já foram relatados casos de empregados que assinaram para receber rescisão no valor de R$ 5 mil, mas não receberam nada a título do documento que tinham assinado. A empresa disse que faria o pagamento em dez parcelas, quando na verdade ela [empresa] tinha a obrigação de efetuar o pagamento integral em dez dias. Então já se vê claramente os prejuízos que tendem a se agravar.    

S – Os trabalhadores tem ciência dos prejuízos que a reforma trabalhista trouxe?

CA – De maneira geral não porque a grande imprensa tem dito que a reforma é algo modernizador e positivo. E as modernizações que a nova lei trabalhista promove são essas que estamos relatando, ou seja, a modernização é jogar as relações de trabalho para situações que antecederam a revolução de 1930, que foi a responsável pela criação da nossa CLT – Consolidação das Leis do Trabalho através do governo Getúlio Vargas, ou seja, a reforma joga o país para trás desse período.

As pessoas só vão perceber a verdadeira reforma trabalhista na vida prática, ou seja, com a dor e com o sofrimento que a reforma vai acarretar. Quando um número maior de trabalhadores for penalizado. Os meios de comunicação estão mentindo descaradamente para proteger seus interesses e os interesses de seus anunciantes, que são as empresas a quem essa reforma serve.

S – Os contratos anteriores à reforma trabalhista possuem direitos adquiridos em relação a acordos e convenções coletivas firmados entre sindicatos e empresas?

CA – Sim. Dentro da concepção de direito adquirido entram os atos e situações jurídicas pré-constituídas e que não podem ser alteradas pela nova Lei. Significa que as situações anteriormente existentes não podem ser alteradas por essa nova legislação.

S – Qual o seu entendimento sobre a jornada de trabalho de doze horas diurnas?                                                                                                                                                                                                                         

CA – A jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis de descaso só poderia ser aplicada em setores onde não se exija grande atenção, grande intensidade de trabalho, seja física ou mental. Segundo os estudiosos, aplicar no setor da saúde, onde já se pratica a jornada na parte da noite, é permissível em estabelecimentos de saúde eletivos, pois o trabalho noturno é rarefeito, espaçado.

O trabalho diurno é mais intenso, exige uma atenção muito mais concentrada. Uma jornada alongada tende a levar o trabalhador ao cansaço e a fadiga. Consequentemente, o modo como esse trabalho é realizado e o resultado desse trabalho é bastante prejudicado. A jornada de doze horas seguidas é inadequada, inconveniente, tanto para o trabalhador quanto para o paciente. É o tipo de jornada que não deve ser aplicada porque corre o risco de o trabalhador fatigado cometer erros que podem resultar em danos à saúde de outra pessoa. Depois querer culpar o trabalhador pelo erro cometido porque estava cansado por uma jornada inadequada é um contrassenso. Mostra a irresponsabilidade de quem defende esse tipo de reforma.

S – O que é o trabalho intermitente?

CA – É nada mais do que colocar na carteira de trabalho o famoso bico. É você contratar alguém, assinar a carteira e oficializar o bico. É chamar o profissional para trabalhar quando tem a demanda. Desse modo o trabalhador não sabe quando vai ser convocado. Pela nova Lei, o trabalho intermitente pode ser aplicado em qualquer atividade.         

S – O MPT vem fomentando uma campanha de valorização dos sindicatos. A proposta é levar o trabalhador de volta aos seus sindicatos. Qual a importância da mobilização dos trabalhadores neste momento?

CA – Um dos pontos da reforma trabalhista é o enfraquecimento dos sindicatos. Não só pela retirada da obrigatoriedade da contribuição sindical, mas pela retirada do sindicato de uma série de situações em que ele era obrigado atuar, como homologações, rescisões trabalhistas, todas situações importantes porque o sindicato tinha a oportunidade de conversar com seu trabalhador num momento crítico.

Através de um procedimento aberto por mim, temos buscado promover a discussão do fortalecimento das entidades sindicais, mostrando para os próprios sindicatos e para a sociedade que os sindicatos são membros imprescindíveis à nossa sociedade, para manter um equilíbrio. Existem várias deficiências no segmento sindical, como existem em vários setores da sociedade, o que é necessário superar, se discutir e ver formas de solução, mostrando aos trabalhadores a necessidade que se tem da sua participação para que tenha entidades sindicais fortes.  

S – E quais são as ações para a promoção dessa valorização?

CA – Já começamos desde 2017, com a realização do I Seminário de Formação Sindical, onde se discutiu a questão da reforma trabalhista e o planejamento sindical. Decorrente disso estamos estudando a realização de um curso sobre a Lei 13.467/17 e a realização do segundo seminário, previsto para acontecer entre os meses de maio e junho. Um dos pontos a ser discutido são as condutas antissindicais por parte dos empregadores, tendo em vista que muitas empresas perseguem trabalhadores que procuram se aproximar dos sindicatos, perseguem as lideranças, todas práticas ilegais que precisam ser melhor compreendidas para serem devidamente repelidas, já que elas não se harmonizam com o que a lei estabelece. (Fonte: Sateal)          

CNTS

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