Opas Brasil está construindo documento com principais desafios do SUS até 2030
O Sistema Único de Saúde brasileiro ainda está longe de estar entre os mais eficientes do mundo, mas é importante ponderar que tais comparações com outras nações devem levar em conta que nenhum país no planeta tem um modelo de prestação de saúde universal e gratuito tão completo, inclusivo e abrangendo um volume tão grande de cidadãos. Hoje, mais de 208 milhões de pessoas no Brasil têm acesso ao SUS.
Além do volume, a diversidade de tratamentos cobertos também chama a atenção de gestores públicos de saúde estrangeiros. Só em 2014, o SUS realizou mais de 4 bilhões de atendimentos em ambulatórios, 11,5 milhões de internações e 1,4 bilhão de consultas. Por mais que a saúde pública nacional possua falhas, sofrendo com a falta de investimentos ao longo de décadas, tendo sucateado a infraestrutura do modelo e demorando bem mais que o ideal para usufruir das novas tecnologias do setor, é preciso reconhecer que os últimos anos registraram avanços importantes.
Recentemente, a representação da Organização Pan-Americana de Saúde no Brasil – OPAS Brasil reuniu pesquisadores nacionais e internacionais que analisaram os avanços do SUS nestes 30 anos e apontarão os desafios e os possíveis caminhos para a sustentabilidade do sistema de saúde em 2030, data em que os países estipularam alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – ODS da Organização das Nações Unidas – ONU. Os pesquisadores foram convidados pela OPAS Brasil para elaborarem documento para ser publicado este ano, como parte das atividades da Agenda 30 anos de SUS, que SUS para 2030?, promovida pela instituição.
“Este estudo tem um valor muito interessante para a literatura internacional, especialmente, para os investigadores na área de saúde pública global, porque o SUS é um sistema que promove a cobertura universal. Além disso, é um modelo muito interessante que pode ser seguido por outros países. O SUS tem várias políticas que visam ampliar os serviços e o acesso, principalmente, para a população mais vulnerável, como o Programa Mais Médicos”, explicou uma das coordenadoras da pesquisa, a assessora na área de investigação de Sistemas e Serviços de Saúde na OPAS em Washington, Gisele Almeida.
Segundo a pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Ligia Giovanella, o documento que está sendo elaborado vai proporcionar o panorama da implementação do SUS nestes 30 anos, e vai possibilitar ter uma avaliação de todos os avanços que o sistema teve até o momento em termos da expansão da cobertura, da mudança do modelo assistencial e também da redução de desigualdades com a ampliação do SUS, principalmente, com os desafios que o sistema irá enfrentar.
“O Documento veio no momento bem oportuno, o país está enfrentando uma crise política econômica muito forte, eu diria uma crise ético moral, em que o SUS está sob gravíssima ameaça. Com a Emenda Constitucional 95/2016, que congela os gastos públicos com saúde por 20 anos, teremos um risco de desmantelamento da saúde pública”, relatou a pesquisadora.
Papel da sociedade
Para o pesquisador do Imperial College of London, Thomas Hone, a sociedade tem um papel relevante na defesa do SUS. Diante do cenário de crise econômica, com a vigência da EC 95/2016, Thomas Hone acredita que “se deva manter o compromisso político com o SUS, não só em nível federal, mas também em níveis municipal e estadual, e que para isto é fundamental o papel da sociedade, para pressionar, para assegurar que os ganhos que foram alcançados com o SUS, por meio de importantes políticas, como o Programa Estratégia Saúde da Família e o Programa Mais Médicos, não sejam perdidos, e que continuem sendo fortalecidos”.
Para Thomas Hones, que atua na pesquisa em Atenção Primária em Saúde, a iniciativa da OPAS é uma grande oportunidade para compartilhar conhecimentos. “Já que estamos discutindo os desafios que o SUS enfrenta para o futuro, acredito que é importante trazer todas as lições, de diferentes lugares, que possam representar oportunidades para o SUS vencer seus desafios”, opina Hones.
Para o professor de Sistemas Globais de Saúde na Universidade de Harvard, Rifat Atum, a sustentabilidade do SUS passa pela defesa da política de saúde. “Espero que o SUS consiga ser sustentável, mas também é importante que políticos e todos no país realmente trabalhem para proteger esta importante conquista”, defende.
“O SUS é parte do processo de democratização no Brasil, ele deu esperança, deu oportunidades, e também deu muitos direitos para os indivíduos perceberem esses seus direitos à saúde. Também é muito importante que o SUS foi capaz de ultrapassar o conceito, que de fato conseguiu implementar reformas realmente amplas, focando em atenção primária à saúde, de acordo com os princípios da Declaração de Alma-Ata. Este é um dos poucos sistemas que conseguiram passar do conceito para a realidade, com resultados incríveis”, ressalta Rifat Atum. (Com Portal da Inovação na Gestão do SUS)