MP pede que TCU investigue suspeita de compra superfaturada de cloroquina pelo Exército
Brasil
Preço pago pela matéria-prima para a cloroquina teria aumentado seis vezes; procurador vê indícios de superfaturamento.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) pediu a abertura de investigação sobre o possível superfaturamento na compra sem licitação de matéria-prima para medicamentos à base de cloroquina e no aumento em até 84 vezes na produção desses produtos pelo Comando do Exército. Na representação, o procurador Lucas Furtado pede ainda que seja averiguada a responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro no caso.
Na solicitação, o procurador menciona reportagens que indicaram que, em um ano, o preço pago pelo Comando do Exército pela matéria-prima para a cloroquina aumentou seis vezes. Em grande parte, esse aumento vem sendo atribuído ao aumento do preço do insumo no mercado internacional, custos de frete e variação cambial. Furtado também cita reportagem mostrando que, entre março e abril deste ano, o órgão aumentou em 84 vezes o volume de produção de medicamentos à base de cloroquina como parte do esforço do governo federal no combate à pandemia da Covid-19.
Desde o início da pandemia, os preços de diversos insumos e produtos utilizados no combate à Covid-19 registraram aumentos no Brasil e em outras partes do mundo. No caso brasileiro, o cenário foi agravado pela desvalorização do real frente ao dólar que, no ano, foi de aproximadamente 40%.
O procurador diz considerar que flutuações causadas pela pandemia e pela variação cambial podem ter afetado os preços, mas avalia que aumento tão significativo assim mostra indícios de superfaturamento.
“Embora o possível aumento do custo dos insumos, do transporte e do dólar possa ter influenciado o aumento do preço, ainda assim adquirir o produto por um valor seis vezes maior numa compra sem licitação, a meu ver, representa forte indício de eventual superfaturamento, situação que merece ser devidamente apurada pelo controle externo da administração pública”.
Furtado diz que o governo desperdiça recursos públicos adquirindo matéria-prima e medicamentos à base de cloroquina para tratar pacientes com Covid porque não há evidências científicas de que a substância é efetiva no tratamento da doença.
“No caso da fabricação em massa de medicamento que não se comprova eficaz para o tratamento do coronavírus, resulta num desperdício de recursos públicos que deve ser devidamente apurado e os responsáveis penalizados na forma da lei, especialmente se há suspeitas de superfaturamento na aquisição de insumos”, diz um trecho do documento.
O procurador diz ainda que, diante da defesa aberta de Bolsonaro quanto ao uso da cloroquina no tratamento da Covid-19, é preciso apurar suas responsabilidades em relação às compras de insumos e no aumento da produção do medicamento. Segundo ele, o presidente age de forma voluntariosa e sem base científica.
“É sabido que a defesa da cloroquina é encampada diretamente pelo Presidente da República sendo razoável compreender que o contexto de que trata a presente representação – produção massiva de produto que, ao final, não será útil para os propósitos que motivaram esse ato – é resultado direto do voluntarismo da autoridade máxima do país, sem base científica ou médica”, diz o despacho.
Estudo suspenso – Na quarta-feira, 17, a Organização Mundial de Saúde – OMS suspendeu, pela segunda vez, estudo que investigava a efetividade da droga no tratamento de pacientes com Covid-19. Mesmo assim, o Ministério da Saúde mantém sua política de orientar o uso de cloroquina para pacientes com sintomas leves da doença. Inclusive, o órgão orientou o uso da droga para crianças e gestantes infectadas pelo coronavírus.
Procurado, o Exército disse que o laboratório responsável pela fabricação dos comprimidos de cloroquina, apesar de ser uma organização militar, está subordinado ao Ministério da Saúde e da Defesa e que não caberia ao Comando do Exército emitir comentários sobre o assunto.
Jair Bolsonaro vem sendo um dos principais defensores do uso da cloroquina no país. Dois ministros da Saúde – Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich – deixaram o governo após desentendimentos com o presidente que queria ampliar o uso do medicamento no país apesar da ausência de evidências científicas quanto a sua eficácia.