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Governo muda sistema de registro de mortes por Covid-19 e números despencam

Saúde

Após número recorde de óbitos, Ministério da Saúde inclui novos campos de preenchimento obrigatório nas fichas de registro de pacientes, sem aviso aos municípios, atrasando notificações de mortes por Covid-19 e reduzindo os números. Pasta volta atrás após pressão, mas mudança afetou balanço de alguns estados.

Com recordes diários de mortes por Covid-19 registrados todos os dias, o governo tentou retomar a estratégia de desinformação, usada por Eduardo Pazuello em junho do ano passado, e alterou o sistema de notificação de óbitos sem informar as secretarias de saúde, provocando um atraso na inclusão dos dados desde na terça-feira, 23. Com isso, promoveu uma queda artificial nos números da pandemia. Foram incluídos no cadastro de óbitos dados como CPF, cartão SUS, registro de estrangeiro e se a pessoa havia ou não sido vacinada contra a Covid-19. Outros dados foram excluídos.

Os critérios de registro de óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave foram alterados na terça-feira, dia em que o país registrou um número recorde de mortos em razão da doença, com 3.251 óbitos. Após críticas, o Ministério teria voltado atrás na decisão, mas a mudança nos critérios já afetou os números de mortes já divulgados por alguns estados nesta quarta-feira, como São Paulo, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.

Para o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ), afirmou que o novo ministro da saúde “faz exatamente o mesmo que Pazuello fez ao assumir o Ministério da Saúde, tentando esconder os mortos”. “Marcelo Queiroga está fazendo exatamente o mesmo que Pazuello fez ao assumir o Ministério, tentando esconder os mortos. O Ministério está mudando critérios de registro de óbitos para maquiar os números. O governo Bolsonaro não tem e não terá compromisso com o combate à pandemia”, afirmou.

Nova metodologia de contagem – Na terça, o Ministério incluiu novos campos de preenchimento obrigatório na ficha do Sivep-Gripe, passando a exigir informações como o número do CPF, nacionalidade, número do Cartão Nacional do Sistema Único de Saúde e se o paciente já foi ou não vacinado contra o coronavírus.

O preenchimento do campo do CPF, que antes era considerado apenas como “essencial”, se tornou obrigatório. Contudo, se o paciente não tivesse o CPF em mãos, passaria a ser obrigatório fornecer o número do Cartão Nacional do SUS. Estão isentos dessa regra aqueles que se declararem indígenas na ficha.

Segundo apurou o jornal Folha de S. Paulo, citando um funcionário do ministério, algumas instabilidades já foram reportadas ao Datasus, que administra o sistema de informações do órgão.

O problema veio à tona em coletiva de imprensa concedida pelo governo de São Paulo no início da tarde da quarta, 24. O secretário estadual de Saúde Jean Gorinchteyn, disse que a alteração foi feita sem aviso prévio e poderia causar nos próximos dias um “represamento de dados” sobre a pandemia, induzindo a um número artificial de mortes pela Covid-19.

O reflexo já estava sendo sentido nos dados de São Paulo, que registrou apenas 281 óbitos nas últimas 24 horas, uma queda de 24,3% em relação ao dia anterior. Na véspera, o Estado já havia batido o seu recorde com 1.021 mortes pelo coronavírus, o que representou quase um terço do total do País, que ultrapassou pela primeira vez a marca das 3 mil vidas perdidas para a doença.

“Os municípios não foram devidamente informados, não se deixou prazo para que eles possam se habilitar nessa mudança e [os municípios] não conseguiram completar o preenchimento desses campos. Os campos que foram inseridos retardam o aporte dessa informação e muitos deles não têm importância nesse momento. Isso passa a ter um impacto”, alertou Gorinchteyn.

Em entrevista coletiva, o novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, negou intenção de esconder dados da Covid-19 com alterações na forma de notificar óbitos da doença, que viraram alvos de reclamações de secretários de Estados e municípios. “Eu não sou maquiador, eu sou médico”, disse. Pouco após o fim da entrevista, o Ministério da Saúde voltou atrás nas mudanças.

O Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde – Conasems explicou que a nova forma de registrar estes óbitos já estava em discussão, por causa da “necessidade de aprimoramento nas informações coletadas”, mas que houve falha na comunicação sobre a mudança.

O presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde – Conass, Carlos Lula, também afirmou que a pasta precisava rever “imediatamente” a mudança nos critérios. Segundo ele, o Conselho que reúne as secretarias estaduais de Saúde do país não foi avisado pelo Ministério sobre a medida.

Para Marcelo Gomes, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz e coordenador da plataforma InfoGripe, que faz uso do Sivep-Gripe, as mudanças têm lógica e atendiam a um pedido antigo de quem trabalha com o banco de dados. O CPF ou o CNS, diz, oferecem uma identificação única do indivíduo, o que ajuda a evitar, por exemplo, casos de duplicidade, ou a identificar suspeita de reinfecção.

“Mas tem problemas práticos, porque nem todo mundo carrega o CPF, e o pessoal da vigilância já tinha começado a ter problema em diversas unidades de saúde”, disse ao Estadão. Com a obrigatoriedade, os agentes de saúde tinham de pesquisar o CNS do paciente ou mesmo fazer o registro, o que leva tempo.

“A mudança tem sentido, tem pontos positivos, mas fazê-la no momento atual, acaba trazendo diversos riscos não só de aumento no atraso da notificação, mas até de ficarmos sem algumas notificações”, alerta. “Na urgência, na pressa, pode ser que simplesmente deixem de preencher e uma morte pode ficar sem notificação”.

Cinco Estados relatam problemas – Ao menos cinco Estados relataram dificuldades ao formalizar os registros junto ao Ministério da Saúde na quarta-feira, segundo levantamento do consórcio de veículos de imprensa. Goiás, Paraíba, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo confirmaram problemas com o sistema. Em Goiás, alguns municípios relataram dificuldades. Na Paraíba, o problema atrapalhou o registro de mortes diante da instabilidade, o mesmo relatado pelo Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Fonte: Deutsche Welle Brasil, Estadão e Rede Brasil Atual
CNTS

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