Governo autoriza redução e suspensão de salário dos trabalhadores
Trabalho e Emprego
MP 936 permite o corte de até 70% na jornada e no salário, além da suspensão do contrato de trabalho. De acordo com o Dieese, rendimentos devem cair de 5% a 30% com a medida. Quem recebe até um salário mínimo terá rendimentos preservados. Salários que superam o teto do seguro desemprego devem registrar maiores perdas.
O governo de Jair Bolsonaro autorizou, novamente, a suspensão do contrato de trabalho e do pagamento de salário como medida para “combater o desemprego”, por meio da Medida Provisória – MP 936/2020, publicada no Diário Oficial da União na quarta-feira, 1. As reduções poderão ser feitas em qualquer percentual, inclusive da totalidade do salário, e têm prazo máximo de 90 dias.
A nova medida também libera a suspensão de contratos de trabalho por até dois meses, mas estabelece o pagamento do seguro-desemprego nesses casos. Em linhas gerais, os trabalhadores abrangidos pela MP receberão uma compensação do governo que pode chegar a 100% do que receberiam de seguro-desemprego em caso de demissão –, o valor do seguro-desemprego varia de R$ 1.045 a R$ 1.813,03.
A medida poderá ser aplicada por meio de acordo individual com empregados que têm curso superior e recebem até três salários mínimos, ou seja, R$ 3.135, ou mais de dois tetos do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS: R$ 12.202,12.
Para além dessas condições, o acordo deve ser feito coletivamente entre trabalhadores e empregador. Caso empresa e empregado decidam por uma redução menor que 25%, o trabalhador não receberá o benefício.
A medida provisória também define regras para a redução de carga horária, que poderá durar até três meses. Pelas regras do programa, nenhum trabalhador poderá ter remuneração inferior a um salário mínimo após o corte de jornada.
No caso da redução do contrato, o governo pagará um benefício calculado com base no seguro-desemprego. Se houver suspensão do contrato, a empresa, dependendo de seu faturamento, pode ter que pagar uma parte da renda ao trabalhador.
Em contrapartida, o empregado terá estabilidade no emprego por um período igual ao da redução de jornada ou suspensão de contrato. Por exemplo, se o acordo for de dois meses, ele terá estabilidade durante os dois meses do acordo e por dois meses adicionais – no total, estabilidade de quatro meses.
Rendimentos devem cair de 5% a 30% – O Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, criado pela MP 936 deve acarretar perdas de até 30% nos rendimentos dos trabalhadores formais, nos casos de redução parcial da jornada de trabalho, segundo o Dieese.
Segundo o diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Junior, sindicatos e empresas devem negociar para buscar reduzir perdas dos trabalhadores, com o objetivo de manter ao menos seus rendimentos líquidos, reduzindo, assim, os impactos sobre as redes de solidariedade. A proposta também pode ser aprimorada, quando for votada no Congresso Nacional.
“No casal, aquele que tem emprego formal acaba dando suporte para o outro, que está desempregado ou na informalidade. Acaba suportando também a família do irmão, do pai ou do filho. Muitas vezes expande esse núcleo até para amigos e vizinhos. Quanto mais se mantiver a renda do trabalhador formal, mais essas redes de solidariedade se espalham com possibilidade de manter conjuntos maiores da sociedade com melhores condições de vida durante a pandemia”, afirmou.
Magistrados do Trabalho dizem que a norma viola a Constituição – Para a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – Anamatra, a MP viola a Constituição ao ‘insistir’ na validação de acordos individuais sobre coletivos e ao discriminar diferentes possibilidades de negociações de acordo com a faixa salarial. A entidade afirma que a MP ‘afronta a Constituição e aprofunda a insegurança jurídica já decorrente de outras mudanças legislativas recentes’.
“Diferenciar os trabalhadores para permitir acordo individual, negando a necessidade de negociação coletiva, acaso recebam remuneração considerada superior e tenham curso superior, é negar a força normativa da Constituição e do Direito do Trabalho. A proteção jurídica social trabalhista, como outras proteções jurídicas, é universal, e não depende do valor do salário dos cidadãos”, afirma a Anamatra.
A associação pontua que a Constituição Federal apenas prevê a redução salário por meio de acordos e convenções coletivas e, por isso, o uso de acordos individuais viola a autonomia negocial coletiva e vai à contramão dos direitos trabalhistas.
“A Anamatra reafirma a ilegitimidade da resistência de setores dos poderes político e econômico que intentam transformar uma Constituição, que consagra direitos sociais como fundamentais, em um conjunto de preceitos meramente programáticos ou enunciativos”, afirmam os magistrados.