Entidades ressaltam falta de estrutura e fiscalização no ensino EaD
Após denúncia da má qualidade do ensino à distância feita pela CNTS e comprovada por meio de visitas técnicas do Cofen sob a determinação do Ministério Público, a comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado reascendeu a discussão em torno do tema, principalmente após o Decreto 9.057/17 que regulamenta o ensino à distância como modalidade educacional. As entidades representativas dos trabalhadores atacaram a qualidade do ensino virtual, uma vez que, na saúde, a prática é primordial para trazer à realidade do aluno o dia a dia da profissão, que tem como material de trabalho a vida humana.
“A CNTS manifesta preocupação em razão das especificidades que redundam a área da saúde, não sendo possível a formação de profissionais por meios inadequados para tanto, até porque a atividade do cuidar ultrapassa as necessidades do capitalismo e a vida consiste no maior bem da humanidade, devendo ser preservada a todo custo”, disse a diretora de Assuntos Internacionais da Confederação, Lucimary Santos, representando a CNTS na mesa de debate.
Lucimary ressaltou ainda experiências pessoais ao lidar com profissionais que não sabiam executar procedimentos básicos no cuidado com os pacientes. “Diariamente me deparo com a má execução de práticas em saúde por parte de profissionais recém-formados na modalidade presencial. Se não conseguimos garantir a plena execução dos procedimentos básicos de um egresso da modalidade presencial, que teve além das disciplinas práticas, a oportunidade de estágio na área, fiscalizar a qualidade do EaD é mais difícil ainda”.
A CNTS reconhece que a modalidade EaD é um dos grandes motes do mundo moderno, cuja premissa maior consiste na inclusão social, ou seja, a possibilidade de formação técnica e superior atende as necessidades de um segmento significativo da população que antes ficara alijada do processo de formação. Porém, contesta a formação à distância na área da saúde. Lembra que mesmo a modalidade de ensino tradicional na área de enfermagem, ou seja, o modelo presencial, não tem atendido de forma satisfatória as exigências da assistência à saúde em razão de vários elementos agregados, dentre os quais destaca-se a má qualidade na formação e a precariedade nas condições de trabalho.
A coordenadora da Câmara Técnica de Educação e Pesquisa do Cofen, Valdelize Pinheiro, concorda com a posição da CNTS e relatou a situação encontrada pelos técnicos do Conselho durante a vista aos polos de EaD. “Visitamos mais de 300 polos de apoio presencial. O que constatamos foi o total descuido com a formação profissional e com a segurança do paciente que será atendido por estes egressos. Encontramos polos instalados dentro de oficinas mecânicas ou em locais improvisados, sem biblioteca e nenhuma infraestrutura. Que tipos de conhecimentos de práticas em saúde estes alunos vão ter?”, questionou.
Sobre a grade curricular dos alunos do curso de enfermagem na modalidade EaD, Pinheiro destacou que apenas no fim do curso são ministradas aulas práticas. “Das mais de 4.000 horas/aula obrigatórias para cursos à distância, somente 800 horas/aula são de disciplinas práticas, demonstrando que os alunos de EaD passam quatro anos aprendendo teorias e apenas no quinto ano têm contato com a prática”.
Segundo a representante do Conselho Nacional de Saúde – CNS, Francisca Rêgo, o órgão já se posicionou contrário à modalidade. “Não se trata da ferramenta em si ou da legislação, e sim de como, na prática, o ensino à distância acontece. A preocupação do CNS é com a qualidade da educação, para que, ao sair do curso, o aluno esteja preparado para prestar assistência adequada à população”, disse.
Já os que se posicionaram a favor do tema, professores e representantes de associações de instituições e alunos da modalidade EaD, defenderam a entrada das inovações tecnológicas no campo educacional.
“Precisamos entender o padrão de qualidade do EaD regulamentado pelo Ministério da Educação. Este tipo de modalidade deve ser visto como processo de educação qualificada do ensino superior. O ensino virtual não é uma abreviação ou facilidade da aprendizagem. Não podemos impedir o crescimento dos cursos EaD”, disse o presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, Luiz Curi.
Na mesma linha de pensamento, Henrique Sartori, representante da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior, definiu esta modalidade de ensino como realidade crescente. “O Decreto 9.057/17 moderniza o processo regulatório dos cursos EaD. Não são cursos feitos sem qualidade. Com o recente crescimento dos cursos à distância, estamos desmistificando a tese de que os cursos nesta modalidade são desqualificados. A realidade aponta que o EaD não é mais acessório e sim uma opção para quem não pode se enquadrar na grade horária de um curso presencial”.