Conflitos e manobras marcam leitura do relatório da reforma trabalhista

Conflitos que quase levaram às vias de fatos marcaram a discussão do relatório apresentado pelo senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), nesta terça-feira (23), referente ao PLC 38/2017, da reforma trabalhista, na Comissão de Assuntos Econômicos – CAE. A maioria da comissão rejeitou recurso apresentado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que pedia o adiamento da leitura do parecer. Diante do tumulto, o presidente da Comissão, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), suspendeu a sessão. Porém, em mais uma manobra da base governista, a sessão foi reaberta, o relatório foi dado como lido e concedida vista coletiva aos membros do colegiado.

A votação do relatório está prevista para a próxima terça-feira (30). No âmbito da CAE foram apresentadas 193 emendas ao Projeto, entretanto, o relator não acatou nenhuma. O parecer de Ferraço é pela aprovação do projeto, sem alteração do texto aprovado na Câmara dos Deputados, mas com recomendação de vetos a seis pontos, que tratam das questões gestante e lactante em ambiente insalubre, serviço extraordinário da mulher, acordo individual para a jornada 12×36, trabalho intermitente, representantes dos empregados e negociação do intervalo intrajornada.

A estratégia do relator, que deve apresentar o mesmo relatório na Comissão de Assuntos Sociais – CAS, foi de recomendar o veto a esses pontos para que sejam regulamentados posteriormente por medida provisória a ser editada pelo Poder Executivo. Após deliberação na CAS, a matéria segue para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – CCJ, na qual o senador Romero Jucá (PMDB-RR) é o relator e deve seguir o mesmo entendimento de manter o teor do texto pelos deputados.

Oposição

Antes da leitura do relatório, a Comissão de Assuntos Econômicos – CAE realizou mais um debate sobre a reforma trabalhista, em que as divergências marcaram as discussões entre convidados e senadores. A audiência foi solicitada por senadores da oposição, sob a justificativa de terem um debate mais equilibrado e com o enfoque nos impactos da reforma trabalhista na economia.

Falaram dois convidados pela oposição e dois pela situação. O professor e economista da Universidade de Campinas – Unicamp, Márcio Pochmann, convidado pela oposição, afirmou que a reforma trabalhista não vai elevar o nível de emprego no país. Ele citou estudo da Organização Internacional do Trabalho – OIT, realizado entre 2008 e 2014 em 110 países que realizaram mudanças na legislação trabalhista. O estudo concluiu que não houve efeito relevante das reformas sobre a elevação do emprego.

“As mudanças na legislação trabalhista, seja para proteger o trabalhador, seja para liberalizar o funcionamento do mercado de trabalho, não impactam o mercado de trabalho, não elevam o nível de emprego, porque a determinação do emprego em uma economia capitalista é dada pelo nível de demanda agregada, e não pelo custo da mão de obra”, disse o economista.

Segundo o professor de economia da Unicamp, Eduardo Fagnani, a reforma trabalhista trará impactos negativos para a economia do país e para a Previdência. Ele explicou que a terceirização e a reforma trabalhista vão incidir sobre os 50% que contribuem. Para Fagnani, a reforma pode representar uma “combinação explosiva”, que pode conduzir a uma inviabilidade financeira no médio prazo.

“Vamos ter, com a reforma trabalhista, uma série de trabalhos temporários ou trabalhos intermitentes – que são trabalhos de curta duração. O que acontece com isso? Acontece que a pessoa fica trabalhando durante um período, sai do mercado de trabalho, volta depois; prolonga o seu tempo de contribuição para a Previdência; dificilmente vai conseguir comprovar 25 anos para Previdência e dificilmente vai se sentir estimulado para contribuir para a Previdência”, explicou.

Defensores

O professor de economia da Fundação Getúlio Vargas – FGV, André Portela, que defende a reforma, chamou a atenção para o alto grau de rotatividade no mercado de trabalho brasileiro mesmo em tempos em que a economia não estava em crise. Para ele, a proposta de reforma trabalhista ataca pontos da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, para melhorar a proteção aos trabalhadores e incentivar relações de trabalho duradouras e ganhos de produtividade.

“Ela [a proposta] permite ganhos entre as partes; propõe a redução dos custos de transação; permite alguma flexibilidade entre horas e benefícios, o que é importante para ajustes em situações de choques negativos; reduz as incertezas jurídicas, dado o ativismo do nosso Judiciário trabalhista; tenta alinhar estruturas de incentivos para relações de trabalho duradouras, além de adequar a proteção ao trabalhador às novas formas de relações do trabalho devido às novas tecnologias”, disse Portela.

O professor da instituição de ensino e pesquisa Insper, Sérgio Pinheiro Firpo, afirmou que as regras trabalhistas atuais não são inclusivas no que diz respeito aos trabalhadores que estão ingressando no mercado, porque elas entram em detalhes minuciosos da relação de trabalho. Além disso, para Sérgio, os acordos feitos por sindicatos acabam sendo revistos na Justiça do Trabalho, o que tira a legitimidade dos sindicatos.

“A principal ideia é que [a reforma] torne a legislação mais flexível e com menos incertezas, ao ampliar e regular o alcance do trabalho parcial, o que permitirá que trabalhadores mais jovens e aqueles com filhos pequenos tenham mais opções em suas buscas; regular o teletrabalho, que vai reduzir custos desnecessários de deslocamento e permitir que trabalhadores em determinadas ocupações ampliem suas buscas por emprego. Há toda uma mudança tecnológica que a gente tem que levar em conta”, afirmou.

Debate

Os senadores da oposição criticaram a reforma, dizendo que as condições de trabalho se tornarão precárias e que, num momento de crise, os trabalhadores não conseguirão ter seus direitos garantidos. Além disso, a oposição afirmou que a reforma beneficiará apenas os empresários e que não deveria estar tramitando no momento de crise política que se vive no país.

As avaliações são de que o objetivo da reforma trabalhista não é o de aumentar o emprego, mas o de colocar sobre os mais pobres o ônus da dívida pública. E também de que a reforma só interessa aos empresários e que os trabalhadores serão prejudicados, especialmente com a terceirização e o trabalho intermitente.

Defensores do projeto apontam que a reforma é necessária para superar as distorções entre os trabalhadores e melhorar a situação daqueles que estão na informalidade; que o país precisa enfrentar problemas como a alta rotatividade no mercado de trabalho, a informalidade e os conflitos; proporcionar o crescimento das pequenas e médias empresas, com uma legislação mais flexível; e levar ao aumento do emprego e dos salários. (Com Agência Senado e Diap)






CNTS

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