Confederações vão ao Supremo por inconstitucionalidade das MPs 664 e 665
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde – CNTS e outras entidades que compõem o Fórum Sindical dos Trabalhadores – FST deram entrada em Ação Declaratória de Inconstitucionalidade das Medidas Provisórias 664 e 665, de 2014, junto ao Supremo Tribunal Federal. O documento utiliza o argumento da pertinência temática, que prevê a inconstitucionalidade de dispositivos das MPs, na parte em que estipulam uma série de alterações nas regras do seguro desemprego, abono salarial, pensão por morte, auxílio doença e auxílio reclusão e que representam retrocesso na condição de vida, e, portanto, social.
As entidades alegam que “as normas restringem o direito à percepção de benefícios de caráter alimentar substitutos do salário, benefícios estes que representam e recebem a natureza de direitos fundamentais, impassíveis de serem modificados sem o devido processo legislativo e blindados pelo próprio artigo 246 da Constituição Federal”. A ação é proposta em conjunto com as confederações de trabalhadores na indústria (CNTI), na alimentação (CNTA), em turismo e hospitalidade (Contratuh), em empresas de crédito (Contec), em Transportes Terrestres (CNTTT), em edifícios e condomínios (Conatec), da indústria gráfica (Conatig) e dos servidores públicos (CSPB).
Por força do princípio da vedação do retrocesso social, argumentam as confederações, “uma vez alcançado determinado nível de concretização dos direitos sociais, é proibido que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. É inválida qualquer norma, por inconstitucionalidade, que revoga uma norma infraconstitucional concessiva de um direito sem que seja acompanhada de uma política equivalente. E, no caso, a regressão em destaque foi feita sem qualquer compensação”.
Para a assessora jurídica da CNTS, Kamilla Flávila, a conquista dos direitos fundamentais pelos cidadãos se deu por meio de inúmeras batalhas empreendidas e não pela bondade do Estado. “Estas conquistas [do trabalhador] buscam assegurar o mínimo essencial à dignidade da pessoa humana, sem que o Estado possa exercer alguma autonomia sobre isto. Trata-se, pois, de uma garantia absoluta a ser resguarda pelo Estado Democrático de Direito”, disse.
De acordo com os autos da ADI, “não existe o estado de urgência e absoluta necessidade que justifique o retrocesso nos direitos trabalhistas. A propósito, as medidas provisórias editadas colocam os trabalhadores em grave risco social, em situação de vulnerabilidade decorrente de adoecimento, desemprego involuntário e morte de ente familiar, o que já desqualificaria os supostos requisitos autorizadores da edição de medida provisória para esse fim”.
A MP 665 é a que mais afeta os trabalhadores em geral. O documento entregue ao STF apresenta dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – Dieese. Segundo o estudo, a limitação do abono salarial apenas aos trabalhadores que mantiveram vínculos formais por pelo menos seis meses, implica em beneficiar apenas 35% dos trabalhadores anteriormente beneficiados. Isso significa que a medida, ao impor modificação nas regras de concessão do abono salarial impactará sobre a população mais vulnerável, aquela de maior rotatividade no trabalho e de salários mais baixos.
O mesmo estudo aponta que dos 12,5 milhões de empregos formais rompidos sem justa causa em 2013, cerca de 3,2 milhões de trabalhadores (25,9%) não teriam direito ao benefício, visto que não completaram os 6 meses exigidos pela legislação.
Outro argumento utilizado para justificar a inconstitucionalidade das MPs é o fato de que o artigo 246 da Constituição Federal proíbe edição de medida provisória para a regulamentação de artigo da Constituição cuja redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada entre 1º de janeiro de 1995 e a data da promulgação da Emenda Constitucional nº 32, de 2001.
A Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, fala sobre o sistema de Previdência Social. Para Flávila, por esta razão caracteriza-se a impossibilidade de regulamentação da matéria por meio de medida provisória. “É fundamental lembrar que, somente por meio de lei ordinária, o Executivo poderá regulamentar ou promover alterações sobre os critérios definidos em lei para a concessão de benefícios previdenciários”, afirma.
MP 664 – Esta medida altera diversos benefícios da Previdência Social e do Regime Próprio dos Servidores Públicos; muda a forma de cálculo da pensão por morte, inclui carência para sua concessão e estabelece tabela de duração em função da idade do beneficiário; estabelece teto para o valor do auxílio doença e aumenta o intervalo de tempo a ser suportado pela empresa empregadora; altera rol de beneficiários; estende prazo para requerimento de compensação financeira entre os regimes previdenciários.
A ação impetrada pelas entidades que compõem o FST considera que as alterações promovidas pela MP 664, em detrimento dos trabalhadores, minoraram os benefícios do auxílio doença, tornando mais rígidas suas condições de deferimento, sendo que tais restrições foram impostas por razões meramente orçamentárias. Situação que encontra como barreira o princípio da vedação do retrocesso social, uma vez alcançado determinado nível de concretização dos direitos sociais, é proibido que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive.
MP 665 – Aumenta a exigência do tempo de permanência dos trabalhadores no ano base para concessão do abono salarial; altera as exigências para a primeira e segunda solicitação do benefício do seguro desemprego; altera o seguro desemprego destinado aos pescadores artesanais em período de defeso, para tornar mais claro o enquadramento para fins de concessão do benefício pecuniário, diferenciando aqueles que vivem exclusivamente da pesca daqueles que exercem outras atividades profissionais.
A ação impetrada pelas entidades que compõem o FST considera que com a MP 665, para ter direito ao primeiro acesso, é necessário que o trabalhador comprove ter trabalhado pelo menos 18 meses nos últimos 24 meses anteriores à dispensa. Levando em consideração os dados da pesquisa RAIS 2013, observa-se que o contingente de trabalhadores que não teriam direito ao benefício do seguro desemprego aumentaria para 8 milhões, ou seja, 64,4% do total de desligados. Por excluir a categoria que mais utiliza e precisa do seguro desemprego, retirando uma necessidade humana básica, o artigo 194 da Constituição está sendo violado, restando inconstitucional os artigos 3º e 4º da MP 665.