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Carta de Brasília – Encontro Nacional de Raça e Etnias

Nos dias 26 e 27 de novembro de 2014, no Hotel Nacional, em Brasília, Distrito Federal, numa realização da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde – CNTS, por proposta de seu Comitê de Raça, 123 dirigentes sindicais membros das entidades representativas da categoria nos três graus do Sistema Confederativo, reuniram-se no Encontro Nacional Raça e Etnias, com o lema Desconstruindo preconceitos.

O Encontro teve como objetivo geral proporcionar conhecimento aos dirigentes sindicais e trabalhadores(as) da Saúde acerca das questões que envolvem inclusão dos negros e demais grupos étnicos no mercado de trabalho e sua participação no movimento sindical; e fortalecer e consolidar o seu papel na construção da sociedade, nos locais de trabalho e no movimento sindical a partir da incorporação de políticas e ações que visem o fortalecimento da luta e garantia de um sindicalismo forte, combativo e atuante.

Teve como objetivo específico instrumentalizar o trabalhador na saúde com conhecimentos que possam facilitar o desempenho de suas atividades profissionais bem como nas suas relações de trabalho; participação nas lutas e conquistas decorrentes da atividade sindical classista; bem como capacitação e mobilização para o enfrentamento de questões recorrentes, tais como: forma de acesso ao mercado; como entender a manifestação do preconceito em decorrência da raça ou etnia; formação e qualificação profissional como condicionantes para estruturação da carreira, dentre outras.

Temas das palestras e debates: Conceitos de Etnia e Raça: A diversidade cultural e seus reflexos no mercado de trabalho; Igualdade de oportunidades no mundo do trabalho – justificação das cotas como políticas de inclusão; Políticas Públicas de Inclusão Social – voltadas para o combate ao racismo e a inclusão de grupos étnicos.

Os delegados participantes do Encontro reconhecem:

– Discriminação racial ou étnico-racial é toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada;

– A Lei Áurea trouxe a abolição, mas a igualdade não faz parte ainda do cotidiano do Estado Democrático de Direito;

– Mesmo após mais de 300 anos da morte de Zumbi dos Palmares, o negro no Brasil ainda convive com o preconceito racial e a discriminação – as denúncias de racismo aumentaram 81% no primeiro semestre de 2014 em relação ao mesmo período de 2013;

– Os negros ainda são maioria entre as vítimas da violência – no período de 2001 a 2010, enquanto a morte de jovens brancos associadas à violência caiu 27,1%, a de negros cresceu 35,9%;

– Os negros são os últimos a serem contratados e os primeiros a serem demitidos nas empresas; são os que percebem os menores salários, a despeito da igualdade de função exercida e da qualificação – um trabalhador negro ganha 36,11% menos que um trabalhador não negro;

– Em praticamente todos os indicadores de saúde – mortalidade infantil, violência, mortalidade materna –, a população negra tem desvantagem; 70% dos negros dependem do Sistema Único de Saúde – eles são as vítimas esquecidas de moléstias como glaucoma, falsemia, lúpos e albinismo;

– Mais de 3,8 milhões de brasileiros de 4 a 17 anos estão fora da escola e em sua maioria são homens negros com renda domiciliar de até meio salário mínimo per capita;

Essas desigualdades são resultado não somente da discriminação ocorrida no passado, mas, também, de um processo ativo de preconceitos e estereótipos raciais que legitimam, quotidianamente, procedimentos discriminatórios.

O enfrentamento desses fenômenos requer a atuação conjunta de um Estado efetivo com uma sociedade ativa e fortalecida. Requer, ainda, a articulação e a convergência de diferentes tipos de intervenção que vão desde a repressão às práticas de racismo, passando por ações de valorização da população negra e pela combinação de políticas sociais universais com políticas afirmativas.

A discriminação racial fere os direitos humanos à medida que exalta uns em detrimento de outros. Nesse sentido, defendemos:

– Modificação das estruturas institucionais do Estado para o adequado enfrentamento e a superação das desigualdades étnicas decorrentes do preconceito e da discriminação étnica;

– Implementação de incentivos e critérios de condicionamento e prioridade no acesso aos recursos públicos destinados ao enfrentamento das desigualdades étnicas no tocante à educação, cultura, esporte e lazer, saúde, segurança, trabalho, moradia, meios de comunicação de massa, financiamentos públicos, acesso à terra, à Justiça, e outros.

– As medidas de combate à discriminação racial devem considerar a trajetória dos negros brasileiros que empenharam suas vidas para construir o País;
– O Estatuto da Igualdade Racial é um importante instrumento na luta por igualdade, devendo ser conhecido, respeitado e implementado;

– Uma lei sozinha não é capaz de extirpar da sociedade um problema de gerações, portanto, a igualdade depende de maior esclarecimento da população, pois a educação é a base de uma sociedade organizada;

– Embora a sociedade tente disfarçar seus preconceitos, o Estado reconheceu a necessidade de garantir igualdade de condições entre negros e brancos, isonomia antes não prevista. Assim, a adoção de cotas e outras políticas compensatórias devem servir como meio para dar garantir à população negra condições de disputa em pé de igualdade; as políticas públicas de afirmação devem observar a inserção do negro no mercado de trabalho; igualdade de assistência nas áreas de educação, saúde e segurança;

– Deve-se condenar qualquer procedimento que seja de recusa, falta de oportunidade ou anulação de emprego por parte da empresa ou agência de emprego baseada na cor ou etnia da pessoa;

– É preciso capacitar defensores públicos para o atendimento especializado em questões de discriminação;

– O governo deve atuar nas questões fundiárias para garantir às comunidades tradicionais o domínio pleno de seus territórios assegurados constitucionalmente.

A infundada discriminação racial ofende sobremaneira a paz e a harmonia entre as pessoas, a convivência, lado a lado, de indivíduos iguais, como seres humanos, em sua natural desigualdade, seja quanto à aparência, convicções, ou qualquer outra forma de diversidade.

É papel do movimento sindical de trabalhadores contribuir para o fortalecimento das iniciativas governamentais por meio do aprofundamento dos debates e reflexões sobre as ações afirmativas. E ainda, contribuir para o fortalecimento das entidades e ações antirracismo; para a ampliação do diálogo e formulação conjunta de políticas públicas; e intensificar a divulgação de instrumentos que fortalecem as ações nacionais e internacionais no que diz respeito à promoção da igualdade racial.

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde – CNTS, com este evento, exerce um dos mais importantes papeis deferidos ao movimento sindical, qual seja, a organização e capacitação dos trabalhadores para o enfrentamento das lutas diárias decorrentes das desigualdades capituladas em razão da discriminação racial e étnica.

Entendemos que a persistência dos altos índices de desigualdades raciais compromete a evolução democrática do país e a construção de uma sociedade mais justa e coesa.

Brasília-DF, 27 de novembro de 2014

 

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde – CNTS

Federações filiadas e Sindicatos vinculados

CNTS

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