Assédio moral no trabalho deve ser crime, defendem especialistas em audiência no Senado
Política
De acordo com o Ministério da Saúde, quem passa por estes constrangimentos pode desenvolver problemas de saúde e sensação de inferioridade.
Levantamento realizado pelo portal Vagas, mostra que 52% dos trabalhadores relatam ter sofrido algum tipo de assédio no local de trabalho. Porém, mais de 87% não denunciaram aos órgãos competentes, o que serviu de alerta para que o tema voltasse à tona dos debates, visando para dar suporte às vítimas. Propostas de criminalização do assédio moral no trabalho foram debatidas pela Comissão Senado do Futuro – CSF. A audiência pública fez parte do ciclo de debates 2022: O Brasil que queremos, voltado à discussão de medidas para o desenvolvimento social, tecnológico e econômico brasileiro até o ano em que se comemora o bicentenário da independência do país.
Segundo o presidente da Comissão, senador Hélio José (Pros-DF), o assunto precisa ser debatido para que a legislação seja aperfeiçoada e o assédio eliminado das relações de trabalho. “O assédio moral é a exposição dos trabalhadores a situações humilhantes e constrangedoras repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. Não podemos admitir o assédio moral, sexual e nenhum tipo de coação ou de pressão contra o trabalhador”.
A maior parte do grupo que relatou ter sofrido assédio no ambiente de trabalho – 39,4% – disse que não fez a denúncia por medo de perder o emprego. Outros fatores apontados como inibidores foram receio de represálias, citado por 31,6% dos entrevistados, vergonha (11%), medo que a culpa recaia sobre o denunciante (8,2%) e sentimento de culpa (3,9%). Já entre os que tiveram coragem de relatar o fato, 74,6% afirmaram que o agressor permaneceu na empresa mesmo após a denúncia.
Ainda de acordo como levantamento, o assédio moral, caracterizado por piadas, chacotas, agressões verbais ou gritos constantes, lidera a incidência de casos. Entre os entrevistados, 47,3% declararam já ter sofrido este tipo de agressão. As mulheres são as maiores vítimas e respondem por 51,9% dos casos. Outro grupo declarou ter sofrido assédio sexual, caracterizado por comportamentos abusivos como cantadas, propostas indecorosas ou olhares abusivos, somou 9,7% da amostra. As mulheres são definitivamente as mais afetadas, respondendo por 79,9% da amostra. Já os homens, representam 20,1% do total.
Consequências – O assédio traz consequências para a carreira. Entre as vítimas, 39,6% disseram que o episódio impossibilitou ou causou dificuldades no desenvolvimento profissional. Na audiência da CSF, Maura Gonçalves, coordenadora-geral do Coletivo Nacional de Trabalhadores Assédio Nunca Mais, explicou que o grupo surgiu da sua experiência com o assédio e tem o objetivo de amparar pessoas em igual situação. “O assédio moral é uma coisa que deixa o profissional afastado dele mesmo e de suas funções. Uma situação tão degradante que você não consegue reagir. Eu passei por assédio moral durante três anos. Ele vai te roubando toda a possibilidade de se firmar como pessoa e como profissional e você vai adoecendo”.
O coletivo propõe a criação de duas novas normas, uma que criminalize o assédio moral e outra que reconheça o sofrimento de assédio como uma doença do trabalho. Maura alerta ainda que muitas vezes as pessoas só procuram ajuda quando chegam em uma situação extrema e prolongada de assédio, podendo chegar até ao suicídio.
Sem norma – Já Ricardo Carneiro, procurador do Trabalho e membro da Coordenadoria Nacional de Promoção de Igualdade de Oportunidades – Coordigualdade, afirmou que há pouquíssimas normas de alcance geral no Brasil, a maior parte é de âmbito estadual ou municipal. Além disso, destacou que a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT é insuficiente porque não prevê punição ao assediador, exceto quando se trata de assédio corporativo, não vale para o servidor público e não abarca os vários tipos de assédio.
“É fundamental que se tipifique o crime relacionado com o assédio moral. O Ministério Público do Trabalho é a favor da criminalização do assédio moral que atenda tanto ao setor público quanto ao setor privado”, defendeu.
Ricardo disse ainda que é preciso ter cautela na criação de uma nova legislação para que esta não banalize o crime e não seja excessivamente analítica ou inaplicável. Ele sugere que a conduta seja enquadrada como crime formal, sem a exigência da produção do resultado para a ocorrência do crime, e como delito simples, possível de ser praticado por qualquer pessoa.
Na falta de legislação, João Paulo Ferreira Machado, auditor fiscal do Ministério do Trabalho, recomenda que as vítimas de assédio moral interpessoal anotem com detalhes as ocorrências e evitem ficar sozinhas com os assediadores. Na identificação da conduta, ele recomenda que a vítima recorra aos superiores hierárquicos do assediador e às ouvidorias institucionais, além de sindicatos e Ministério Público.
Cenário – No Brasil, o assédio moral no trabalho está muito relacionado a situações de caráter discriminatório. As principais vítimas são as mulheres, negros, pessoas com deficiência e com idade avançada. A perpetuação da prática está relacionada também ao cenário econômico do país. “O assédio moral é uma violência de caráter global, mas no caso brasileiro ela assume uma faceta cruel na medida em que vem somada a um contexto de crise econômica e desemprego”, afirma Ricardo Carneiro.
Trabalhadores informados – A CNTS está campanha permanente, desde 2007, que visa informar os trabalhadores sobre prevenção e formas de denúncia nos casos de assédio moral no trabalho. Por meio da cartilha Assédio moral no trabalho: atitude para mudar, a Confederação tem o objetivo de ampliar o debate e o conhecimento sobre os tipos de assédio e alertar sobre as condutas mais comuns adotadas pelos agressores.
“É extremamente necessária a inclusão do tema na ordem do dia dos dirigentes sindicais de todas as esferas do sistema confederativo, no sentido de mostrarmos ao trabalhador que ele não está só. Além disso, ressalto a importância de nosso trabalho junto ao Poder Legislativo com o objetivo de pressionarmos os parlamentares pela aprovação de propostas que coíbam e tipifiquem como crime o assédio moral nas relações trabalhistas”, disse o presidente da CNTS, José Lião de Almeida. (Com informações Agência Senado e Portal Vagas)