Apenas 15% dos profissionais de saúde se sentem preparados na pandemia, diz FGV
Coronavírus
Falta de apoio, de treinamento, testes e EPIs, fazem nove em cada 10 profissionais que atuam na linha de frente do combate à doença dizerem sentir medo do coronavírus.
A grande maioria (68%) dos profissionais de saúde se sentem despreparada para lidar com o combate à pandemia de coronavírus no Brasil. Dentre agentes comunitários, enfermeiros, médicos e demais integrantes das equipes ampliadas, apenas 15% afirmam se sentirem preparados. Os dados são da pesquisa intitulada A pandemia de Covid-19 e os profissionais de saúde pública no Brasil, realizada pelo Núcleo de Estudos da Burocracia – NEB, da Escola de Administração de Empresa de São Paulo – EAESP da Fundação Getúlio Vargas – FGV.
O levantamento virtual foi realizado entre os dias 15 de abril e 1º de maio de 2020, com 1.456 profissionais que atuam nas diferentes esferas da saúde pública em todos os estados do país.
A principal consequência da falta de condicionamento para lidar com a pandemia – que inclui treinamento, acesso a equipamentos de proteção individual, acesso a informação, suporte governamental e políticas de suporte emocional – é que nove em cada 10 profissionais que atuam na linha de frente do combate à doença dizem sentir medo do coronavírus.
Mais da metade (55%) afirma conhecer alguém – colegas de trabalho ou familiares – que se contaminou ou foi diagnosticado com suspeita de Covid-19.
Vulnerabilidade – Em apresentação virtual, a professora do FGV e coordenadora do NEB, Gabriela Lotta, destacou que o Brasil lidera o ranking de mortes dos profissionais de saúde em decorrência da doença, respondendo por 50% dos óbitos em todo o mundo. “A pesquisa mostra que os profissionais de quem mais dependemos para enfrentar a pandemia estão em situação de extrema vulnerabilidade. Há escassez de equipamentos de proteção, faltam informações e suporte governamental e a maioria não se sente preparada para lidar com a crise”.
Para além da distribuição periódica dos EPIs para todos que estão na linha de frente – dos profissionais de limpeza aos médicos –, ela defende que os que lidam diretamente com os pacientes devem ser testados regularmente, para evitar que médicos e enfermeiros se transformem em vetores da Covid-19, principalmente na fase assintomática da doença.
EPIs – Menos de um a cada três (32,97%) profissionais afirmou ter recebido materiais adequados para trabalhar diariamente com segurança, como máscaras, álcool em gel, luvas, etc. Os outros 67,03% ou não receberam EPIs ou tiveram que adquirir e/ou produzir seus próprios equipamentos. Nessas condições, ressaltou a pesquisadora, é difícil avaliar a qualidade desses materiais, o que aumenta o risco de contaminação.
O recebimento de EPIs é um dos índices que apontam para as desigualdades regionais do país. Enquanto na região Sudeste, 58,9% dos profissionais afirmam ter recebido equipamentos suficientes, esse número cai para apenas 16,9 nos estados do Norte.
Também revelam as desigualdades entre as profissões. Cerca da metade dos médicos – 52,9% afirmam contar com EPIs, enquanto que, entre os Agentes Comunitários de Saúde – ACS e Agentes de Combate à Endemia – ACE, esse número é de apenas 19,6%. Os profissionais de enfermagem 62,3% dizem contar com equipamentos de proteção.
Apoio, treinamento e informação – Somente 21,91% relataram ter recebido algum tipo de treinamento para lidar com o novo coronavírus. Enquanto quase metade dos médicos (45%) e enfermeiras (41,2%) dizem ter recebido treinamento, apenas 11% dos ACSs e ACEs dizem o mesmo.
Além de serem maioria entre os profissionais de saúde, são os ACSs e ACEs que estão em contato mais direto com a população. Principalmente nas áreas mais vulneráveis, destacou a pesquisadora. Sem treinamento e sem acesso adequado a informações oficiais, estes, bem como os demais profissionais, dizem que não conseguem se contrapor às fake news. É o caso, por exemplo, da suposta eficácia de determinados medicamentos, como a hidroxicloroquina.
Também dois em cada três entrevistados – 67% afirma que não sentem apoio do governo federal. Pouco mais da metade também reclama da falta de suporte dos governos estaduais – 51% e municipais – 56%.