Aos 86 anos, carteira de trabalho vale menos após reformas de Temer
A Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS ícone dos direitos trabalhistas no país, completou 86 anos na quarta-feira, 21. Para juristas ouvidos pelo Brasil de Fato, pouco há para ser comemorado. Há mais de quatro meses em vigor, a reforma trabalhista do governo Temer é apontada como principal responsável pelo desmonte desses direitos.
Noemia Porto, vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – Anamatra, afirma que a CTPS é um “um grande símbolo de cidadania do trabalho”. No entanto, a juíza do Trabalho pondera que “em um século que já começa com reforma trabalhista extremamente abrangente, acho que o que fica colocado para o futuro é se ela ainda continuará sendo esse símbolo. Isso porque a reforma acaba fazendo uma opção por contratos precários de trabalho”.
Segundo Porto, as demissões em massa após a entrada em vigor da Lei 13.467/2017 – que instituiu a reforma trabalhista – são o principal sintoma disso, principalmente no ensino superior particular. “Na prática, [as faculdades particulares] pretendiam mandar para fora os empregados para contratá-los em modalidades precária. Essas demissões tomaram o espaço de muitas ações judiciais”, afirmou a magistrada.
Já para a advogada trabalhista Paula Cozero, outro grande impacto da nova lei trabalhista está relacionado aos obstáculos criados para o acesso à justiça. “A reforma também é uma tentativa de enfraquecimento do Judiciário trabalhista, então, traz uma confusão para as normas processuais. Além disso, há a nova modalidade do trabalhador ser condenado a pagar pelas despesas do processo. Isso dá bastante insegurança aos trabalhadores”.
Os dados divulgados pela última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Pnad, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE mostram que no último trimestre de 2017, mais de um quarto dos postos de trabalho gerados no país surgiram no setor privado sem carteira de trabalho assinada.
Retrocessos – A Lei 13.467/2017 criou, entre suas medidas, a figura do chamado trabalho “autônomo exclusivo”, a partir do qual o profissional poderá prestar serviços de forma contínua para uma única empresa sem que isso seja caracterizado como vínculo empregatício. A reforma trabalhista também estabeleceu o conceito do trabalho intermitente e reiterou a Lei da terceirização, aprovada anteriormente pelo governo de Michel Temer.
Para a advogada Paula Cozero, o desmonte da Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT no país tem sido vendido pelo governo e pela mídia como um incentivo ao trabalho informal.
“Há um estímulo grande para as pessoas se virarem no mercado de trabalho, transvestido de empreendedorismo. Precisamos cuidar desse discurso porque acabamos jogando muitos trabalhadores no mercado informal sem proteção. A carteira de trabalho representa ainda algum nível de proteção, mas não é a mesma que o trabalhador tinha há tempos atrás”, afirmou. Cozero apontou o aumento da jornada de trabalho como determinante para essa precarização da proteção do trabalhador.
Na opinião de Marcos Verlaine, analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – DIAP, a reforma trabalhista foi “o maior ataque ao direito do trabalho desde a promulgação da CLT”. Para ele, a questão mais preocupante trazida pela reforma trabalhista é a instituição do “negociado sobre legislado”.
“Isso desconfigurou a CLT. Ela já permitia negociar acima da lei, nunca abaixo, então era um marco regulatório que permitia negociar para acrescentar direito. Então ficou latente que o objetivo da nova lei trabalhista não era modernizá-la, e sim abrir mão da proteção do trabalhador para proteger a empresa e o capital”, disse. (Fonte: Brasil de Fato)