‘Agenda Brasil’ para conter a crise no país ameaça direitos dos trabalhadores
O presidente do Senado, Renan Calheiros, propôs, e o governo referendou a discussão de uma pauta em tramitação no do Poder Legislativo com o objetivo de buscar soluções que apontem para o reaquecimento da economia, aperfeiçoamento da segurança jurídica e melhoria do ambiente de negócios no país. Renan defende que o Congresso deve se dedicar a solucionar os problemas do Brasil, acima de questões partidárias e do próprio governo. A agenda está dividida em três eixos: Melhoria do Ambiente de Negócios, Equilíbrio Fiscal e Proteção Social. A proposta, no entanto, reúne temas polêmicos que podem afetar direitos dos trabalhadores.
“A agenda tem oportunidades e ameaças, do ponto de vista dos trabalhadores”, ressalta o jornalista, analista político e diretor de documentação do Diap, Antônio Augusto de Queiroz, no artigo Agenda Brasil: ameaças e oportunidades. Ele cita como temas que devem ser acompanhados atentamente pelo movimento sindical os que tratam da terceirização, idade mínima para aposentadoria, reajuste dos servidores públicos e o princípio da universalidade do atendimento pelo Sistema Único de Saúde.
A agenda contém 27 propostas iniciais. Entre as medidas apresentadas está a aprovação de uma proposta que vincula a política de desonerações da folha de pagamento de empresas ao cumprimento de metas ou de preservação de emprego. Essa foi uma das medidas que mais agradaram ao Planalto. Os projetos sugeridos também preveem um novo modelo de financiamento do SUS, além da realização de duas reformas tributárias: uma envolvendo o ICMS e outra do PIS/Cofins. No âmbito da proteção social, Renan ressaltou a importância de se condicionar as alterações na legislação de desoneração e acesso ao crédito subvencionado a metas rigorosas de geração e preservação do emprego.
No que diz respeito à regulamentação da terceirização, Queiroz lembra que a discussão tem como referência o PLS 30/15, aprovado na Câmara como PL 4.330/04, que em nome de proteger os terceirizados, generaliza a terceirização e substitui a contratação do emprego pela contratação de serviço, com a pejotização em substituição à contratação de pessoas.
“Todo cuidado será pouco em relação ao tema, porque mesmo que o Senado modifique o texto da terceirização, retirando dele as injustiças e os excessos, a matéria retornará para a Câmara, que terá a palavra final. Só na hipótese de tratar do tema em outro projeto, de iniciativa do Senado, para proteger os trabalhadores terceirizados, sem pejotização nem extensão da terceirização para a atividade-fim, é que seria razoável iniciar uma conversa sobre o tema”, afirma.
Esta tem sido a ideia defendida pelo relator do PLS 30/15 na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, senador Paulo Paim (PT-RS), e que conta com apoio do movimento sindical. “Não aceitamos que, no intuito de regularizar a situação de 12,5 milhões de terceirizados, a regulamentação se estenda para precarizar as relações de trabalho de outros 38 milhões de trabalhadores”, ressalta o presidente da CNTS, José Lião de Almeida.
O segundo ponto polêmico citado por Queiroz está relacionado à ideia de instituir idade mínima para efeito de aposentadoria. “A exigência de idade mínima certamente irá prejudicar quem começou a trabalhar mais cedo e terá que contribuir mais que os outros que iniciaram mais tarde. Além disto, o governo acabou de propor uma mudança no fator previdenciário, que resolve parcialmente a pretensão de retardar a aposentadoria, como forma de receber um benefício sem incidência do fator”, avalia.
Segundo Queiroz, o terceiro tema está associado à proposta de reajuste dos servidores dos três poderes. Ele lembra que a última proposta do Senado nesse sentido, o PLP 549/09, arquivado na Câmara, pretendia congelar os gastos com pessoal, uma vez que a União só poderia destinar para a despesa de pessoal, incluindo a contratação de novos serviços, até 2% além da inflação anual e desde que o PIB não fosse menor que os 2%.
“O risco é que se proponha algo semelhante que, na prática, impeça até a reposição da inflação, já que a verba destinada ao reajuste incluiria todas as despesas com pessoal, tais como encargos, reposição de servidores aposentados e contratos de novos servidores, crescimento vegetativo da folha (progressões e promoções), despesa com previdência complementar, e isso poderia congelar as despesas com pessoal. Aliás, o PLP 01/07, de autoria do Poder Executivo, cujas premissas são as mesmas poderá se prestar a esse propósito de congelar salário”, alerta Quiroz.
A quebra da universalidade do Sistema Único de Saúde e à proibição de liminares para fornecimento de medicamentos não disponíveis nos SUS também é criticada por Queiroz. “No primeiro caso, a solução é cobrar do plano de saúde atendimentos que seu segurado fizer no SUS. No segundo caso, não parece adequado limitar o poder do magistrado, no máximo caberia a exigência de consulta previa aos órgãos de regulação da saúde, para evitar desperdícios de recursos”.
“A CNTS não transigirá na defesa dos princípios constitucionais, entre eles a universalidade do atendimento pelo SUS”, destaca José Lião de Almeida, ao criticar que a área da saúde é afetada sempre que se propõem e/ou adotam medidas econômicas e de ajuste fiscal. “Os cortes no orçamento da União, por exemplo, atingem em cheio a saúde, com a redução de 12 bilhões de reais”.
Segundo o presidente da CNTS, as medidas prejudiciais ao SUS representam um grande retrocesso do governo em sua política pública em prol da saúde do cidadão e de uma sociedade mais justa. “retirar direitos significa a ampliação e agravamento da dor e do sofrimento que já atinge milhões de famílias brasileiras. Em especial, causará um dano maior aos mais necessitados, que dependem do SUS como única alternativa de atendimento”.
Segundo Queiroz, “a ideia de uma agenda é importante para estancar a crise, mas é preciso deixar claro que se trata de uma pauta de interesse do mercado. Os trabalhadores, ao mesmo tempo em que aplaudem iniciativas que contribuam para debelar a crise, devem atuar para evitar retrocessos sociais”. (Fontes: Agência Senado e Diap) A seguir, as propostas que compõem a Agenda Brasil.
Melhoria do ambiente de negócios
– Segurança jurídica dos contratos: blindar as legislações de contratos contra surpresas e mudanças repentinas. Essa blindagem colabora para proteger a legislação das PPP, por exemplo, item relevante nestes tempos em que o País necessita de mais investimentos privados.
– Aperfeiçoar marco regulatório das concessões, para ampliar investimentos em infraestrutura e favorecer os investimentos do Programa de Investimentos em Logística do Governo (PIL).
– Implantar a “Avaliação de Impacto Regulatório”, para que o Senado possa aferir as reais consequências das normas produzidas pelas Agências Reguladoras sobre o segmento de infraestrutura e logística.
– Regulamentar o ambiente institucional dos trabalhadores terceirizados melhorando a segurança jurídica face ao passivo trabalhista potencial existente e a necessidade de regras claras para o setor;
– Revisão e implementação de marco jurídico do setor de mineração, como forma de atrair investimentos produtivos.
– Revisão da legislação de licenciamento de investimentos na zona costeira, áreas naturais protegidas e cidades históricas, como forma de incentivar novos investimentos produtivos;
– Revisão dos marcos jurídicos que regulam áreas indígenas, como forma de compatibilizá-las com as atividades produtivas.
– Programa de estímulo ao desenvolvimento turístico aproveitando o câmbio favorável, e a realização de megaeventos. Incluir a eliminação de vistos turísticos para mercados estratégicos, a simplificação de licenciamento para construção de equipamentos e infraestrutura turística em cidades históricas, orla marítima e unidades de conservação.
– PEC das Obras Estruturantes – estabelecer processo de fast-track para o licenciamento ambiental para obras estruturantes do PAC e dos programas de concessão, com prazos máximos para emissão de licenças. Simplificar procedimentos de licenciamento ambiental, com a consolidação ou codificação da legislação do setor, que é complexa e muito esparsa.
Equilíbrio Fiscal
– Reformar a Lei de Licitações – Projeto da Senadora Kátia Abreu – PLS 559/13.
– Implantar a Instituição Fiscal Independente.
– Aprovar a Lei de Responsabilidade das Estatais, com vistas à maior transparência e profissionalização dessas empresas.
– Aprovação em segundo turno da PEC 84/2015, que impede o Governo Federal de criar programas que gerem despesas para Estados e Municípios e DF, sem a indicação das respectivas fontes de financiamento.
– Regulamentar o Conselho de Gestão Fiscal, previsto na LRF.
– Reforma do PIS/Cofins, de forma gradual com foco na “calibragem” das alíquotas, reduzindo a cumulatividade do tributo e a complexidade na forma de recolhimento.
– Reforma do ICMS (convergência de alíquotas) e outras medidas a serem sugeridas pela Comissão Mista do Pacto Federativo.
– Medidas para repatriação de ativos financeiros do exterior, com a criação de sistema de proteção aos aderentes ao modelo.
– Revisar resolução do Senado que regula o imposto sobre heranças, sobretudo quanto ao teto da alíquota, levando-se em conta as experiências internacionais (convergir com média mundial – 25%).
– Favorecer maior desvinculação da receita orçamentária, dando maior flexibilidade ao gasto público. Estabelecer um TAC Fiscal para “zerar o jogo” e permitir melhor gestão fiscal futura.
– Ampliar idade mínima para aposentadoria, mediante estudos atuariais e levando-se em conta a realidade das contas da previdência social.
– Proposta para reajuste planejado dos servidores dos 3 Poderes, de maneira a se ter uma previsibilidade de médio e longo prazo dessas despesas.
– Priorizar solução para o restos e contas a pagar.
Proteção Social
– Condicionar as alterações na legislação de desoneração da folha e o acesso a crédito subvencionado a metas de geração e preservação de empregos.
– Aperfeiçoar o marco jurídico e o modelo de financiamento da saúde. Avaliar a proibição de liminares judiciais que determinam o tratamento com procedimentos experimentais onerosos ou não homologados pelo SUS.
– Avaliar possibilidade de cobrança diferenciada de procedimentos do SUS por faixa de renda. Considerar as faixas de renda do IRPF.
– Compatibilizar os marcos jurídicos da educação às necessidades do desenvolvimento econômico e da redução das desigualdades.
– Compatibilizar a política de renúncia de receitas, no orçamento público, à obtenção de resultados positivos no enfrentamento das desigualdades regionais e na geração de emprego e renda (trata-se de determinação constitucional).