A “nova” reforma previdenciária: ressuscitando velhos mitos
Juliano Musse[1]
Desde o final de 2014 estamos assistindo, perplexos, a modificação/retirada de direitos de trabalhadores. Por meio das MPs 664 (depois Lei 13.135/2015) e 665 (depois Lei 13.134/2015) determinando novas regras para acesso a benefícios previdenciários como Abono Salarial, Seguro Desemprego, Pensão por Morte, Seguro Defeso e Auxílio Doença, medidas que fazem parte do modelo de ajuste fiscal adotado pelo atual governo. Sob o pretexto de “combater distorções” e “conter gastos” em 2015, a que de fato serviram foi alimentar o “superávit primário”, ou seja, o pagamento da dívida pública[2], que beneficia, principalmente, as grandes corporações bancárias e investidores.
Como se não bastasse tal descalabro, eis que surge nova investida sobre a previdência, segundo o governo a garantir a sustentação do sistema de aposentadorias e pensões no médio e longo prazos. Na pauta, sete grandes temas foram apresentados: (i) idade média das aposentadorias; (ii) financiamento da previdência social; (iii) diferença de regras entre homens e mulheres; (iv) pensões por morte; (v) previdência rural; (vi) regimes próprios de previdência; (vii) convergências dos sistemas previdenciários.
Face ao exposto, este artigo tem o intuito de fazer um resgate do conceito amplo de Seguridade imbricado com algumas das propostas mais polêmicas de mudança na previdência. Será que realmente tais mudanças são oportunas? Ou oportunistas?
Perfil demográfico: a fixação de uma idade mínima de aposentadoria
A exigência de idade mínima é o tipo de requisito que não pode ser universal. Não pode valer indistintamente para todos. Necessário diferenciar aquele trabalhador que foi obrigado a entrar muito cedo no mercado de trabalho, com pouco estudo, se submetendo a menores rendimentos, geralmente em ocupações vinculadas à sua capacidade física; daquele que ingressa no mercado de trabalho após anos de estudo, muitos com ensino superior, e que começa a trabalhar com idade acima dos 25 anos, com maiores rendimentos e em melhores condições de trabalho.
No universo rural a situação se complica, são pessoas que devido às atividades degradantes acabam por envelhecer precocemente, além de serem mais suscetíveis a enfermidades e cuidados especiais na velhice.
É preciso fazer saber que se ao longo dos anos a população vem tendo uma sobrevida maior, fruto, dentre outras, de uma medicina mais avançada, não significa que tenha condições de ter uma carga de trabalho, seja física e/ou mental, na mesma proporção do aumento da expectativa. Nossa realidade laboral é muito sacrificante, principalmente com a parcela mais pobre da população.
Com um olhar sobre a saúde do trabalhador brasileiro, segundo dados da última Pesquisa Nacional de Saúde (PNS)[3], cerca de 40% da população adulta, o equivalente a 57,4 milhões de pessoas, possui ao menos uma doença crônica não transmissível (DCNT). O levantamento, realizado pelo Ministério da Saúde em parceria com o IBGE, revela que essas enfermidades atingem principalmente o sexo feminino (44,5%) – são 34,4 milhões de mulheres e 23 milhões de homens (33,4%) portadores de enfermidades crônicas. Hipertensão arterial, o diabetes, a doença crônica de coluna, o colesterol (principal fator de risco para as cardiovasculares) e a depressão são as que apresentam maior incidência no país.
Embora a longevidade tenha aumentado e no sentido inverso diminuído as mortes precoces por desnutrição infantil e doenças infectocontagiosas consideradas fatais, como a Aids, o envelhecimento vem sendo acompanhado de inúmeras doenças crônicas o que diminui, em muitos casos, a permanência dos trabalhadores no mercado formal. São situações que afetam negativamente a renda do trabalho, além de redução do período contributivo para aposentadoria, o que de certa forma interfere na solvência do sistema.
Essa evidência atrelada ao aumento de doenças crônicas, afetando mais o universo feminino, deve ser ponderada para qualquer modificação do sistema de Seguridade, ainda mais se tratar da inauguração de uma idade mínima quanto à de uma equiparação etária entre homens e mulheres.
É de costume a grande mídia brasileira colocar em evidência a discussão sobre o impacto do envelhecimento da população nas contas da Previdência Social. No Brasil, isso tem acontecido desde o início dos anos 1990, quando se começou a discutir as propostas de reforma do Estado, privatização, abertura ao exterior e desregulamentação do mercado de trabalho. Propostas estas alinhavadas com o chamado Consenso de Washington, que deu sustentação ao pensamento e às políticas neoliberais desenvolvidas na América Latina e em outras regiões do mundo. Quase sem nenhuma exceção, o tom das matérias pautava um caminho sem volta para previdência, rumo a um déficit sem controle devido à rapidez do processo de envelhecimento da população brasileira.
Embora ainda hoje não sejamos um país envelhecido, seremos em 2050, 2060, ainda que distante do padrão europeu. No final da década de 1970 a população jovem era quase 10 vezes superior à população acima dos 65 anos, enquanto projeções indicam que a população idosa será o dobro da jovem em 2060. Enquanto a relação população ativa/inativa era de quase 15 no final dos anos 1970, será de pouco mais de 2 em 2060. Assim, governo e mídia afirmam ser, no futuro, impossível sustentar com contribuições dos trabalhadores ativos o pagamento das aposentadorias.
Essas análises que são colocadas à sociedade carecem de maiores fundamentos, o que leva a uma situação irreal dos fatos. Ao menos dois pontos aqui merecem destaque. Primeiro, porque parte do falso princípio de que a previdência social é financiada exclusivamente por contribuições sobre os salários. Isso não é verdade para os dias de hoje, haja vista a base diversificada de financiamento do sistema, e, provavelmente, não será no futuro. Veja, por exemplo, segmentos como o rural e as micro e pequenas empresas que pagam a previdência com um percentual sobre a comercialização da produção ou do faturamento. Para esses segmentos, a contribuição independe do quantitativo de trabalhadores empregados.
Um segundo ponto, de extrema importância, se refere ao percentual da População em Idade Ativa, pessoas entre 25 e 59 anos, que, em tese, são ativos e produtivos. Estes aumentarão sua presença na sociedade brasileira até 2020, para nas décadas seguintes começarem a reduzir em percentual do total da população. Contudo, como mostra a Tabela 1, esse percentual, em 2060, não se destoará muito daquele do final da década de 1970 (para melhor visualizar ver as pirâmides etárias).
A ampliação do número de idosos não é o único parâmetro para avaliação das contas públicas. A despesa com esse segmento populacional irá aumentar, mas em parte haverá apenas uma realocação de gastos públicos, visto a mudança de uma densa base da população jovem, no passado, para uma avolumada população idosa, no futuro. Além disso, pelo fato de o aporte à previdência ser feito em parte por esse contingente ativo (juntamente com a base plural de financiamento já reverenciada), as políticas que abrangem a Seguridade deveriam ser direcionadas para este segmento, quais sejam: política inclusiva (formalização em massa, redução da informalidade), melhoria da renda oriunda do trabalho (em que pese mais estudo da população jovem), redução da rotatividade do mercado formal de trabalho, melhores condições de trabalho (melhoria da saúde do trabalhador), maior fiscalização (a evitar sonegações), são alguns dos possíveis direcionamentos mais eficazes. De imediato, assegurar o retorno de um crescimento, com valorização do trabalho e resgate do emprego.
Sob esse ponto de vista o sistema precisa de reforma? Havendo uma pluralidade de fontes de financiamento (superavitária[4], diga-se de passagem) e se resolvendo alguns problemas que circundam o contingente apto a contribuir para o sistema não são soluções mais eficazes? Anunciar que no futuro haverá uma situação insustentável sem antes abordar essas questões é apenas levar uma meia verdade aos olhos da sociedade.
O financiamento da previdência social
As questões normalmente discutidas sobre previdência são os seus aspectos negativos, sendo o “déficit” previdenciário colocado como alvo central para os ajustes fiscais do governo.
É verdade que se analisarmos de maneira unilateral a previdência, apenas contemplando um grandioso orçamento, veremos uma disparidade muito grande entre o urbano e o rural. Enquanto o primeiro consegue uma situação superavitária, o mesmo não ocorre com o segundo, haja vista seu baixo poder contributivo.
Mas este é um olhar puramente fiscalista da previdência, dissociado do conceito amplo de Seguridade Social, do amparo social, da universalidade de cobertura – atender todas as contingências sociais (todos os acontecimentos) que coloquem as pessoas em Estado de necessidade.
Quanto às formas de financiamento, a aposentadoria rural se assemelha aos programas de aposentadoria básica existentes em muitos países de orientação beveridgiana[5] (Seguridade Social pura, universal e gratuita), segundo o qual os indivíduos não precisam obrigatoriamente contribuir financeiramente para ter direito ao benefício, e o acesso ao benefício está relacionado a critérios de cidadania.
Antes de entrarmos em outras questões fiscais é bom que se diga que nenhuma aposentadoria do RGPS é um benefício assistencial, como muitos afirmam ser o rural. É um erro achar que esse subsistema deva ser custeado por verbas orçamentárias, integradas às despesas relativas à assistência social da União. Se não há uma competência fiscalizatória a evitar a sonegação, o problema deixa de ser do beneficiário.
2.1 Entendendo o superávit da Seguridade
As fontes de custeio da Seguridade estão previstas no art. 195, §§ 1º e 2º da Carta de 1988 e são provenientes de recursos dos Orçamentos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, e das denominadas contribuições sociais, sendo que a receita dos mesmos não será integrada ao Orçamento da União, bem como o Orçamento da Seguridade Social será elaborado pelos órgãos responsáveis pela saúde, previdência social e assistência social, objetivando as prioridades e metas estabelecidas na lei orçamentária.
Assim, a Constituição Federal de 1988 estabelece que a receita da Seguridade Social conste de orçamento próprio, evitando a “fuga” de recursos para despesas públicas que não as pertencentes a sua área de atuação.
Não por outra razão que seu financiamento é imputado a toda sociedade de forma solidária. As pessoas que possuem capacidade contributiva irão contribuir diretamente através das contribuições sociais e as que não têm capacidade contributiva participarão indiretamente do custeio através dos orçamentos fiscais dos entes federativos.
Posto o amparo legal da previdência, parte integrante do tripé da Seguridade, bem como suas fontes de financiamento, para melhor elucidar a questão peguemos um exemplo, uma notícia recente sobre as exaustivas matérias sobre o “rombo” da previdência social:
“Previdência Social tem rombo de R$ 85,8 bilhões em 2015” (Correio Braziliense)[6].
Os números expostos anteriormente, embora estejam corretos, tratam simplesmente da receita de contribuições previdenciáriasversus as despesas com benefícios. É preciso rememorar, como anualmente faz a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil – ANFIP, que o sistema de Seguridade Social, do qual faz parte a previdência social, é autossustentável e, além disso, tem saldo positivo. Isso porque são contabilizadas as receitas e despesas da previdência, saúde e assistência (Gráfico 1).
Como se pode ver, o saldo da Seguridade vem ao longo dos anos se mantendo superavitário, mesmo em época de crise como a de 2008/2009 ou mesmo em um ano de baixo crescimento econômico e volumosas desonerações como foi 2014.
Portanto, não se pode falar de déficit previdenciário quando se sabe que a Constituição Federal de 1988 criou o sistema de Seguridade Social, financiado por toda a sociedade. O orçamento desse sistema, mesmo diante de crises, desvinculações e desonerações realiza com sobra de recursos a cobertura universal necessária para a manutenção e ampliação das políticas de saúde, previdência e assistência social.
O tripé do sistema de Seguridade social, idealizada pelo constituinte em 1988, trouxe no capítulo da Ordem Social o escopo do bem estar e justiça sociais. Não teve como propósito um ideário meramente fiscalista, mas de amplo espectro, calcada nos moldes do welfare state, na solidariedade, no resgate do entendimento de cidadania, há anos mitigados por políticas que não contemplavam proteção para o benefício básico.
É um erro afirmar que não haverá futuramente recursos para pagamento de benefícios. Essa verdade se confirma quando deparadas com as retiradas/desvios de recursos da Seguridade por meio das desonerações da folha de pagamentos e da DRU. Se pegarmos 2014 como referência, somados os R$ 21,6 bilhões com desonerações da folha de salários aos R$ 63,2 bilhões em Desvinculações da Seguridade via DRU[7], temos quase R$ 85 bilhões retirados da Seguridade Social. Mas o volume de recursos retirado é bem maior. Se computarmos todas as desonerações com contribuições para a previdência[8], o volume de recursos careados chega a R$136,5 bilhões como mostra a Tabela 2. Somados ao desvio da DRU a cifra chegou a R$ 200 bilhões em 2014. Os dados para 2015 e 2016 são estimados.
A desoneração da folha, sabidamente, não cumpriu seu papel. Não alavancou a economia, a indústria não se reergueu, tampouco gerou empregos. Essa perda de receita não pode servir para justificar o argumento de corte de gasto na Previdência. O que definitivamente precisa ser entendido é que penalizar a previdência alegando seus altos custos não é o caminho. A falta de investimentos das empresas para o aumento da produtividade, a falta de uma política industrial robusta e o câmbio respondem pelas imensas dificuldades de competitividade da economia nacional.
No que diz respeito à DRU, estamos diante de uma ameaça, principalmente às áreas sociais. Grande parte dos recursos legalmente desvinculados por este mecanismo financia vários tipos de despesas, inclusive juros e amortização da dívida pública.
Segundo a Anfip (2015)[9] essa subtração de recursos não aparece nos relatórios governamentais como uma transferência de recursos da Seguridade Social para o Orçamento Fiscal. É como se esses recursos fossem, por natureza, do Orçamento Fiscal. Somente da Seguridade Social, entre 2008 e 2014, foram desvinculados quase R$ 270 bilhões, como mostra a Tabela 3.
Sem a vinculação, constitucionalmente prevista, esse recurso vai para o caixa único do tesouro, a ser gasto de maneira espúria. Essa é mais uma das provas da existência de sobra de recursos da Seguridade, afinal, não se têm notícias de desvinculações de recursos de um orçamento deficitário.
Regras de aposentadoria
A questão de gênero – Outro ponto controverso na proposta de reforma da previdência se refere a igualar a idade de aposentadoria entre homens e mulheres. Embora se saiba que de modo geral mulheres têm uma sobrevida maior que a dos homens, essa distinção, para um tempo menor de contribuição da parcela feminina, tem uma origem histórica e cultural.
A concepção aristotélica de que “devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade” é válida no tratamento de gênero das aposentadorias. A doutrina previdenciária leva em conta as atividades domésticas e o tempo que mulheres ficam em casa cuidando dos filhos e da família. É uma fundamentação cultural, haja vista a dupla jornada que a mulher desempenha em grande parte dos lares brasileiros e que não prioriza a expectativa de vida.
Sabe-se que a família tradicional formada pelo homem provedor do sustento familiar e da mulher que exclusivamente cuida dos filhos e da casa já não é tão presente no nosso país e vem mudando ao longo dos anos. Contudo, a trajetória profissional das mulheres dificilmente será igual à dos homens e isso reflete em condições de trabalho, diferenças salariais, responsabilidades domésticas e de cuidados que impactam diretamente sobre a forma como entram e permanecem no mercado de trabalho. Será que a igualdade já atingiu os afazeres domésticos em todas as classes sociais desse imenso Brasil? Se ainda não chegou em um país como a Áustria, que diferencia em 5 anos a aposentadoria de homens e mulheres, quem dirá no Brasil.
Assim, um dos empecilhos para uma reforma previdenciária neste aspecto são as divergências sociais e culturais. Em várias regiões ainda predominam significativamente as instituições familiares tradicionais.
O subsistema rural de previdência: um avanço social
No Art. 7º da CF/1988 encontramos amparo para inserir o segurado rural no sistema, igualando, em direitos, os trabalhadores urbanos e rurais. Considerando todo empregado como contribuinte também ensejou a inclusão dos empregados rurícolas, pois não previu exceção. A regulamentação veio somente mais tarde, com a edição das Leis 8.212/91 e 8.213/91.
A legislação brasileira estabelece um regime jurídico diferenciado aos trabalhadores rurais, denominado de segurado especial. De acordo com a Lei 8213/91 (Art. 48, par. 1o) tem direito à aposentadoria rural por idade o trabalhador rural que completar 60 anos se homem, ou 55 anos se mulher, no valor de um salário mínimo vigente à época da data do requerimento.
Para a concessão desse benefício, além do requisito idade, é indispensável que o segurado especial (trabalhador rural) comprove o exercício da atividade rural, ainda que descontínuo, pelo período mínimo de 180 meses, conforme estabelecido na Lei nº. 8213/91 (art. 142), em regime de economia familiar.
O constituinte, não satisfeito com esses dispositivos, para selar definitivamente o benefício da aposentadoria aos trabalhadores rurais, ainda reconheceu as agruras da atividade no campo ao estabelecer que essa categoria teria redução de idade no acesso à aposentadoria (Art. 202, CF/1988).
Essa redução é salutar por força do desgaste físico desse contingente e faz parte da evolução da Seguridade Social, modelo busca romper com as noções de cobertura restrita a setores inseridos no mercado formal e afrouxar os vínculos entre contribuintes e benefícios, gerando mecanismos mais solidários e redistributivos.
Os benefícios passam a ser concedidos a partir das necessidades, com fundamento nos princípios da justiça social, o que obriga a estender universalmente a cobertura e integrar as estruturas governamentais.
A implantação do subsistema rural de previdência ressaltou seu papel na diminuição da pobreza rural e da desigualdade na distribuição da renda, os benefícios rurais estão afetando a composição dos arranjos familiares, revitalizando a agricultura familiar, a estrutura produtiva e a economia familiar rural.
Além disso, os recursos previdenciários são fundamentais para movimentar a economia e o comércio local, tendo um efeito multiplicador em pequenos e médios municípios.
A manutenção das atuais regras de acesso para o contingente rural se faz presente, bem como a continuidade da melhoria do padrão de vida. Os gráficos 2 e 3 apresentam de maneira melhor a importância da previdência no combate à pobreza, majorada se considerarmos que a maioria dos benefícios emitidos pela previdência foi no valor do salário mínimo (69,2%, incluindo assistenciais e EPU; se considerarmos somente o RGPS o percentual é de 64,4%)[10] em dezembro de 2015. Na clientela urbana, em dezembro de 2015, representou 47,3% do total efetivamente pago, e, no meio rural, quase a totalidade dos benefícios. Essa representatividade denota a importância de se defender um crescimento permanente do salário mínimo, um verdadeiro instrumento de redistribuição de renda, não só como elemento de valorização do trabalho, mas como renda substituta do trabalho, elemento vital para a vida pós-laboral.
O Gráfico 3 nos revela também uma situação grave no Brasil não fossem as transferências previdenciárias. A situação de pobreza observada permanece inalterada até por volta dos 45 anos de idade e se acelera drasticamente após os 60 anos sem o provento de aposentadorias. Acima dos 70 anos de idade, sem aposentadorias a pobreza assolaria 60% da população. No meio rural, em quase sua totalidade, o caso seria agravado por ser a renda oriunda de benefício a única a sustentar o segurado e sua família.
Um trabalho de França (2011)[11] nos revela a importância da previdência para a economia dos municípios. Em 2010, segundo o estudo, a grande maioria dos municípios apresentou pagamento de benefícios superior ao FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Dos 5.566 municípios pesquisados, 3.875 (69,6%) possuíam valor de benefícios pagos superiores ao FPM (Tabela 4). Ligeira melhora na comparação com 2003, onde dos 5.561 municípios existentes à época, cerca de 67,8% (3.773) apresentavam essa condição.
Outro dado curioso do estudo e que confirma a importância dos benefícios previdenciários para o desenvolvimento humano e para a economia dos municípios, se refere ao verificado pelo Índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal (IFDM), tomado como proxy do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Uma análise para o ano de 2007[12] mostrou que em 98 dos 100 municípios mais desenvolvidos, segundo o IFDM, os benefícios emitidos superam o FPM. Em contrapartida, em apenas 47 dos 100 municípios menos desenvolvidos, segundo o IFDM, os benefícios emitidos superam o FPM.
Alguns efeitos positivos da previdência, como a diminuição da miséria no campo e a interiorização da renda, são de pouco conhecimento da sociedade. É preciso frisar que a previdência social pública é fundamental para o aumento da inclusão social. Essas afirmações se solidificam quando se verifica a diminuição do número de pessoas pobres mediante transferências previdenciárias; ou a continuidade do padrão de vida do rurícola com o salário mínimo ganho como benefício após as implantações dos planos de custeio e de benefícios.