A cinco dias de entrar em vigor, reforma trabalhista promete ser devastadora
Em cinco dias entra em vigor a Lei 13.467/17, da “deforma” trabalhista, que extingue o atual modelo de trabalho, colocando no lugar padrões do século 17. Este será o primeiro passo para a volta da escravidão. A alteração em diversos pontos da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, além de retirar garantias dos trabalhadores, enfraquece a representatividade das entidades sindicais ao tirar a obrigatoriedade da sua participação nas homologações de contratos, demissões, na negociação de acordos e também torna opcional o pagamento da contribuição sindical.
O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), usou sua conta no Twitter para anunciar que a Medida Provisória – parte do acordo feito com os senadores para acelerar a tramitação da proposta na Casa, impedindo a aprovações de emendas, o que forçaria o projeto a voltar à Câmara – será editada pelo governo federal na mesma data em que as novas regras entram em vigor, dia 11 de novembro. No documento enviado ao Planalto, os senadores indicaram, à época, os seguintes pontos a serem alterados via MP:
Trabalho intermitente – adoção de “critérios mais claros”, como quarentena de 18 meses para evitar migração de contratos por tempo indeterminado, além de multa contratual de 50% em caso de descumprimento contratual; jornada 12×36 – modificação do artigo que permite a jornada, definindo ser possível apenas quando houver acordo ou convenção coletiva; participação sindical – será explicitada a obrigação da participação dos sindicatos nas negociações. Uma comissão de representantes dos funcionários não poderá substituir o sindicato; gestantes e lactantes – vedação do trabalho em locais insalubres. Será permitido apenas o trabalho em locais de insalubridade média ou mínima e mediante apresentação de atestado emitido por um médico do trabalho; insalubridade – alteração de 2 incisos para definir que enquadramento do grau de insalubridade e prorrogação da jornada em locais insalubres só serão permitidos quando definidos em negociação coletiva; dano extrapatrimonial – será alterado o artigo que vincula a indenização exclusivamente ao salário; funcionário autônomo em trabalho exclusivo – não poderá haver cláusula de exclusividade.
Problemas da reforma – Técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea apontam que, se as instâncias de representação dos trabalhadores não forem fortalecidas, a reforma trabalhista não só prejudicará os trabalhadores como poderá causar diversos problemas para o poder público, incluindo o possível aumento de processos na Justiça do Trabalho e a queda na arrecadação de impostos. Isso porque o cenário pode inviabilizar a negociação coletiva, ponto central da nova legislação.
Para o economista Sandro Sacchet, ao mesmo tempo em que procuraram conceder maior peso à negociação coletiva, estabelecendo que os acordos negociados entre sindicatos e empregadores pode prevalecer sobre a CLT, os legisladores acabaram enfraquecendo o principal representante dos trabalhadores, ou seja, os sindicatos – que perderam a contribuição sindical compulsória –, sem deixar claro como deverão atuar os comitês de empresas e comissões de fábricas. Além disso, na avaliação do técnico, a reforma também procura restringir o acesso dos empregados à Justiça do Trabalho. “A reforma contém inúmeros pontos que enfraquecem o poder de negociação dos trabalhadores e sindicatos, principalmente na questão sobre jornada de trabalho”, declarou Sacchet, que é doutor em economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).
Contradições – Em seu artigo para o boletim do Ipea, Sacchet enfatiza que não discute se havia ou não necessidade de alterar a legislação trabalhista, mas sim a forma como a Lei 13.467/17 foi aprovada. Para o técnico do Ipea, o texto da Lei aprovada está repleto de contradições, podendo gerar consequências contrárias aos três principais benefícios esperados pelos entusiastas da reforma: crescimento do nível de emprego formal; mais segurança jurídica para empregadores e trabalhadores; e aumento da produtividade. “Acho que, possivelmente, nenhum destes três pontos serão atingidos. Pode até ser que sejam alcançados, mas não considero que as condições para garantir isso estejam efetivamente postas pela reforma”, disse Sacchet, enfatizando que o sucesso da reforma trabalhista depende fundamentalmente do fortalecimento da representação
dos trabalhadores na negociação. “Caso não se consiga preservar o poder de negociação dos trabalhadores, deve-se esperar uma ampliação das desigualdades”.
Já o doutor em desenvolvimento econômico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Tiago Oliveira, destacou que as mudanças na legislação vão repercutir também no mercado laboral no campo. “Tanto as mudanças mais amplas, que estimulam a terceirização e introduzem novas formas de contratação, quanto as mudanças mais específicas, relacionadas à jornada de trabalho, aos intervalos e ao pagamento das horas de deslocamento entre casa e trabalho, por exemplo, serão provavelmente utilizadas para regularizar e amplificar práticas comuns no meio rural que estavam sujeitas a sanções”, alerta Oliveira.
Impactos negativos – Oliveira elenca uma série de possíveis impactos sobre as relações de trabalho estabelecidas no campo, como jornadas de trabalho mais extensas, período de descanso mais curtos e salários mais baixos. Além disso, ele teme pela repercussão negativa sobre os contratos de trabalhos informais, uma vez que a legislação trabalhista mais severa sempre serviu de parâmetro para a fiscalização do setor informal. “A reforma vai no sentido de valorizar a negociação coletiva, o que é desejável, desde que isso venha acompanhado pelo fortalecimento do ente que vai representar o elo mais frágil da negociação, que são os trabalhadores”.
“A reforma não fez isso. Ela apenas tira o peso legal da regulação do trabalho no Brasil, eleva o valor da negociação coletiva ao passo que enfraquece os sindicatos”, aponta o economista, defendendo o pagamento da contribuição sindical compulsória por todos os trabalhadores – mecanismo legal abolido com a reforma trabalhista. “Esta proposta tinha que vir acompanhada por uma discussão sobre a estrutura sindical no Brasil, pois as pessoas precisavam entender que a contribuição era cobrada de todos porque os efeitos das negociações coletivas beneficiavam a toda a categoria, seja o trabalhador filiado ou não”.
O que mudará com a reforma trabalhista? – A assessora jurídica da CNTS para assuntos trabalhistas, Zilmara Alencar, lançou projeto de capacitação e contagem regressiva para entrada em vigor da reforma, que traz um panorama comparativo da atual situação dos trabalhadores e o que mudará com a vigência da Lei 13.467/17, resgatando, entre outras coisas, princípios constitucionais e convenções internacionais das quais o Brasil é signatário, para subsidiar o enfrentamento à nova legislação.
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